14 outubro 2012

28º Domingo do Tempo Comum



O buraco da agulha

É certamente uma anedota a história do rico industrial alemão (curioso, mas deve ser coincidência!) que mandou fazer, numa das suas fábricas, uma agulha com um buraco suficientemente grande, para passar por ele o dito camelo das palavras de Jesus no evangelho! Mas é concerteza desse tamanho o buraco que se cria nas consciências de nós, cristãos, quando, em lugares onde possamos ganhar exageradamente (ou até indignamente, se olhássemos bem em volta!), juntamos a fé e o dinheiro numa aliança admirável! A honestidade do homem rico do evangelho, que percebeu não poder seguir Jesus e continuar a adorar os seus bens, ao menos, é autêntica.

Na perspectiva da Bíblia as riquezas são uma bênção de Deus. Atrevo-me a dizer que o desejo de Deus é que todos sejamos ricos. Mas ricos de quê? Simplesmente de coisas que se acumulam e guardam, que precisam de cofres e guardas, e encerram em gaiolas douradas os seus donos? Grande é a embriaguez do possuir, que parece transformar em semi-deuses quem é tão de carne como o mais desventurado dos homens! Como se transforma o dono em escravo de bens e caprichos, prazeres e luxos, seus e dos que parasitam à sua volta? Como se adaptam os valores mais nobres da justiça e do bem comum, e até crenças ou ritos religiosos, a vidas de compromissos dúbios, de esquemas e corrupções para se ganhar mais? As riquezas são dom de Deus, mas os ricos, voltados para si e para a desmesura dos seus apetites, são objecto da indignação dos profetas. Como entrar no reino de Deus se nenhuma “tralha” podemos levar connosco?

A relação justa com os bens é um exercício de sabedoria. A Bíblia aponta a imagem do administrador, do colaborador de Deus na criação, como aquela que melhor serve ao homem. Sábio é quem põe os dons a render, mas encontra maior alegria em colocá-los de novo nas mãos de Deus do que em possuí-los. Em tempo de escassez de bens como o nosso (e, infelizmente, de um abissal distanciamento de ricos e pobres, de direitos e regalias inqualificáveis), a sabedoria é cada vez mais urgente. Sabedoria para escolher o essencial, para promover a inteligência no uso das coisas, para evitar o desperdício, para valorizar o trabalho, para não ceder à tentação do “salve-se quem puder”.    

Entrámos no Ano da Fé e este domingo podemos perguntar: como colocamos Jesus no meio da nossa crise. Quem adoramos? Em que investimos as nossas forças e os nossos bens? Como refreamos a nossa ânsia de consumir e revemos a partilha e a entreajuda? Poderemos fazer gestos insignificantes para a economia mundial. Mas serão certamente um sinal. Porque seguir Jesus agarrado aos bens e continuando a “passar camelos” pelo buraco largo da consciência, pode dar um ar de “bons cristãos”, mas é, certamente, uma grande ilusão! 

P. Vitor Gonçalves
Voz da Verdade 14.10.2012


***

EVANGELHO – Mc 10,17-30
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos

Naquele tempo,

ia Jesus pôr-Se a caminho,

quando um homem se aproximou correndo,

ajoelhou diante d’Ele e Lhe perguntou:

«Bom Mestre, que hei-de fazer para alcançar a vida eterna?»

Jesus respondeu:

«Porque me chamas bom? Ninguém é bom senão Deus.

Tu sabes os mandamentos:

‘Não mates; não cometas adultério;

não roubes; não levantes falso testemunho;
não cometas fraudes; honra pai e mãe’».

O homem disse a Jesus:

«Mestre, tudo isso tenho eu cumprido desde a juventude».

Jesus olhou para ele com simpatia e respondeu:

«Falta-te uma coisa: vai vender o que tens,

dá o dinheiro aos pobres, e terás um tesouro no Céu.

Depois, vem e segue-Me».
Ouvindo estas palavras, anuviou-se-lhe o semblante

e retirou-se pesaroso,

porque era muito rico.

Então Jesus, olhando à volta, disse aos discípulos:

«Como será difícil para os que têm riquezas
entrar no reino de Deus!»

Os discípulos ficaram admirados com estas palavras.

Mas Jesus afirmou-lhes de novo:

«Meus filhos, como é difícil entrar no reino de Deus!

É mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha

do que um rico entrar no reino de Deus».

Eles admiraram-se ainda mais e diziam uns aos outros:

«Quem pode então salvar-se?»

Fitando neles os olhos, Jesus respondeu:

«Aos homens é impossível, mas não a Deus,

porque a Deus tudo é possível».

Pedro começou a dizer-Lhe:

«Vê como nós deixámos tudo para Te seguir».

Jesus respondeu:

«Em verdade vos digo:

Todo aquele que tenha deixado casa,
irmãos, irmãs, mãe, pai, filhos ou terras,

por minha causa e por causa do Evangelho,

receberá cem vezes mais, já neste mundo,

em casas, irmãos, irmãs, mães, filhos e terras,

juntamente com perseguições,

e, no mundo futuro, a vida eterna».

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