08 outubro 2012

Vai um gin do Peter’s?

Com tantas notícias interessantes a acumularem-se, nesta altura, é bem difícil escolher um tema único. Por isso, este gin desdobra-se em dois.

O MELHOR RECANTO EM ESPANHA É PORTUGUÊS

Sem querer acordar polémicas transfronteiriças antigas, vale a pena celebrar a eleição de uma catedral portuguesa, de estilo manuelino, como O MELHOR RECANTO DE ESPANHA, no concurso recentemente promovido pela Repsol. Dedicada a Santa Maria Madalena, foi edificada no século XVI, em Olivença (disputada entre Portugal e Espanha já desde o século XIII).
Além deste templo, outros monumentos marcam a presença lusa naquele povoado estrategicamente localizado nas margens do Guadiana: o castelo, do reinado de D.Dinis, a calçado portuguesa na praça principal, em basalto e calcário, ou a bonita porta manuelina no Paço do Concelho.


PRESENÇA DE PAZ NO MÉDIO ORIENTE

A região conflituosa onde nasceram as religiões que descendem de Abraão foi a última escolha de Bento XVI para deixar uma mensagem personalizada: a Exortação «Igreja no Médio Oriente». Como quis entregá-la por mão própria, no Líbano, a segurança teve de ser fortemente reforçada, para viabilizar esta arriscada deslocação a um país ainda mal refeito dos confronto sangrentos e regulares entre milícias, e situado na raia da guerra civil síria.

Foi junto à linha de fogo que este Europeu de muita idade e coragem convidou à paz, sugerindo «gestos visíveis», capazes de conduzir à «vitória do amor». A sua visita personificou a aproximação que recomenda às outras religiões, etnias e culturas que se entrecruzam (e, por vezes, digladiam) na região, frequentemente dilacerada por ódios e escaramuças violentas: «Venho ao Líbano como peregrino de paz, como amigo de Deus e como amigo dos homens» – afirmou ao aterrar, concluindo quase todas as locuções em língua árabe.   


Demonstrando enorme estima e especial ternura pelo Médio Oriente, Bento XVI deixou palavras de esperança(1), plenamente confiante na riqueza única do património civilizacional da região, que foi berço do monoteísmo e do monaquismo.

Talvez o traço mais marcante da visita tenham sido os inúmeros gestos de paz. É significativo vir de um ilustre representante do Velho Continente o reconhecimento inequívoco da grandeza do Médio Oriente, exaltado como exemplo e baluarte da possibilidade de ecumenismo. A própria grandeza da mensagem do Papa no Líbano estende-se por dois gins. As temáticas de hoje incluem:

- RIQUEZAS DO MÉDIO ORIENTE
- PARA CHEGAR À VERDADE PRECISAMOS DE TODA A HUMANIDADE
- O AMOR AO PRÓXIMO É CRUCIAL EM QUALQUER RELIGIÃO
- A PAZ DE DEUS IMPLICA GESTOS VISÍVEIS
- OS FUNDAMENTALISMOS ADULTERAM QUALQUER CRENÇA
  
RIQUEZAS DO MÉDIO ORIENTE
- «A feliz coabitação do Islão e do Cristianismo, duas religiões que contribuíram para criar grandes culturas, constitui a originalidade da vida social, política e religiosa no Líbano.» (na Basílica S.Paulo – 14.Set.)
- «Por que motivo escolheu Deus esta Região (para nascer e morrer)? Porque vive ela em turbulência? Parece-me que Deus a escolheu para servir de exemplo, para testemunhar ao mundo a possibilidade concreta que o homem tem de viver o seu anelo de paz e reconciliação; (…) esta aspiração foi impressa por Deus no coração do homem.» (Encontro com Governo – 15.Set.)
- «A convivência feliz de todos os libaneses deve demonstrar a todo o Médio Oriente e ao resto do mundo que, dentro de uma nação, pode haver colaboração entre diversas Igrejas (…). Vós sabeis, tão bem como eu, que este equilíbrio (…) é extremamente delicado. (…) (É) preciso dar provas de real moderação e grande sabedoria; e a razão deve prevalecer sobre a paixão unilateral…» (Boas Vindas – 14.Set.)
- «(É) justo reconhecer a contribuição judaica, cristã e muçulmana para a formação duma rica cultura própria do Médio Oriente.»  (Exortação – ponto 24) 
- «(A) beleza do Líbano encontra-se nesta bela simbiose (entre cristãos e muçulmanos). É preciso que o Médio Oriente inteiro, pondo os olhos em vós (jovens), compreenda que os muçulmanos e os cristãos, o islão e o cristianismo, podem viver juntos, sem ódio e no respeito das crenças de cada um, para construírem juntos uma sociedade livre e humana.» (Encontro com os Jovens – 15.set.)


PARA CHEGAR À VERDADE PRECISAMOS DE TODA A HUMANIDADE
- «(N)ão obstante as divergências humanas e religiosas, há um raio de verdade que ilumina todos os homens. Sabemos que a verdade fora de Deus não existe como uma realidade em si; seria um ídolo. A verdade só pode desenvolver-se na relação com o outro aberta a Deus, cuja vontade é exprimir a sua alteridade através e nos homens meus irmãos. Por isso não é oportuno afirmar de maneira exclusiva: ‘eu possuo a verdade’. A verdade não é propriedade de ninguém, mas é sempre um dom que nos chama a um caminho cada vez mais profundo de assimilação à verdade. Esta só pode ser conhecida e vivida na liberdade, pelo que não podemos impor a verdade ao outro; só no encontro de amor se desvenda a verdade.» (Exortação – ponto 27)
- «Este estar juntos, esta comunhão querida pelo nosso Deus e Senhor é hoje mais necessária do que nunca; ponhamos de lado tudo o que pareça ser causa de insatisfação, mesmo legítima, para nos concentrarmos com um só coração na única coisa necessária: unir todos os homens e o universo inteiro no Filho unigénito.» (Exortação – ponto  95) 
«O que faz rico um país são, antes de mais nada, as pessoas que nele vivem. De cada uma e todas juntas, depende o seu futuro e a sua capacidade de se comprometer pela paz. Tal compromisso só será possível numa sociedade unida. No entanto, a unidade não é a uniformidade. O que assegura a coesão da sociedade é o respeito constante pela dignidade de cada pessoa e a participação responsável de cada um segundo as próprias capacidades, pondo a render o que há em si de melhor. (…) No desígnio de Deus, cada pessoa é única e insubstituível.» (Encontro com Governo – 15.Set.) 
- «É nosso dever iluminar e purificar as consciências e tornar claro que cada homem é uma imagem de Deus; e nós devemos respeitar no outro não apenas a sua alteridade, mas, na alteridade, também a real essência comum de ser imagem de Deus...» (Respostas aos jornalistas – 14.Set.)
- «(E)xorto os (cristãos)… a purificarem sem cessar a memória individual e colectiva, libertando os ânimos dos preconceitos, por meio da mútua aceitação e da colaboração com as pessoas de boa vontade.» (Exortação, ponto 81)
- «Uma melhor qualidade de vida e desenvolvimento integral não é possível senão numa partilha das riquezas e das competências, respeitando a dignidade de cada um. Mas tal estilo de convivência social, sereno e dinâmico, não pode existir sem a confiança no outro, seja ele quem for. Hoje, as diferenças culturais, sociais, religiosas devem levar a viver um novo tipo de fraternidade, onde aquilo que une é justamente o sentido comum da grandeza de cada pessoa e o dom que ela constitui para si mesma, para os outros e para a humanidade. Está aqui o caminho da paz.»  (Encontro com Governo – 15.Set.) 
- «O espírito humano possui o gosto inato do belo, do bom e do verdadeiro; é o selo do divino, a marca de Deus nele! Desta aspiração universal deriva uma concepção moral firme e justa, que sempre coloca a pessoa no centro. Mas é só na liberdade que o homem se pode voltar para o bem.» (Encontro com Governo – 15.Set.) 
- «Uma sociedade pluralista só existe por causa do respeito recíproco, do desejo de conhecer o outro e do diálogo contínuo. Este diálogo entre os homens só é possível com a consciência de que há valores comuns a todas as grandes culturas, porque estas estão radicadas na natureza da pessoa humana. Estes valores, que formam um substrato comum, exprimem os traços autênticos e característicos da humanidade; pertencem aos direitos de cada ser humano.» (Encontro com Governo – 15.Set.) 

O AMOR AO PRÓXIMO É CRUCIAL EM QUALQUER RELIGIÃO
- «Devemos ainda tornar visível no mundo o respeito das religiões, de umas pelas outras, o respeito do homem como criatura de Deus, o amor do próximo como ponto fundamental para todas as religiões.» (Respostas aos jornalistas – 14.Set.)
- «O testemunho (de fé) autêntico requer o reconhecimento e o respeito pelo outro, a disponibilidade ao diálogo na verdade, a paciência como uma dimensão do amor, a simplicidade e a humildade...» (Exortação – ponto 12)
- «(A) convivência de que o vosso país quer dar testemunho – só será profunda se estiver fundada sobre uma visão acolhedora e uma atitude de benevolência para com o outro, se estiver enraizada em Deus que deseja que todos os homens sejam irmãos.» (Boas Vindas – 14.Set.)
- «N’Ele, todos os homens são nossos irmãos. A fraternidade universal, que (Cristo) inaugurou na Cruz, reveste duma luz brilhante e (exige) a revolução do amor. (…) E assim Jesus convida-vos a proceder como Ele, a acolher o outro sem reservas, mesmo que pertença a cultura, religião, nação diferentes. Dar-lhe lugar, respeitá-lo, ser bom com ele torna-vos sempre mais ricos em humanidade e fortes com a paz do Senhor. (…) É bom comprometer-se com os outros e pelos outros. Viver, juntos, momentos de amizade e alegria permite resistir aos germes de divisão, que devemos combater sem cessar. A fraternidade é uma antecipação do Céu.» (Encontro com os Jovens – 15.Set.) 
- «(O)s baptizados são chamados a viver, aqui e agora, em comunhão fraterna entre si, que floresce numa real solidariedade com os outros membros da família humana, sem discriminação baseada, por exemplo, na raça e na religião.» (Exortação – ponto  77)
- «A vocação da Igreja e do cristão é servir; e fazê-lo, como o próprio Senhor, gratuitamente e a todos sem distinção. Assim, servir a justiça e a paz, num mundo onde a violência não cessa de alongar o seu rasto de morte e destruição, é uma urgência de modo a comprometer-se em prol duma sociedade fraterna, para edificar a comunhão. (…) É um testemunho essencial que os cristãos devem prestar aqui, em colaboração com todas as pessoas de boa vontade.» (Missa  em Beirute – 15.Set.)

A PAZ DE DEUS IMPLICA GESTOS VISÍVEIS
- «(A) paz significa estar completo, estar íntegro (…). Antes de ser exterior, a paz é interior. É uma bênção. (…) É um bem de tal forma desejável que se tornou uma saudação no Médio Oriente. A paz é justiça.» (Exortação, ponto 8)
- «Ninguém deveria esperar vantagens da violência; (…) da nossa parte, (isto requer) um trabalho de advertência, educação, purificação. (…) Diria, uma vez mais, gestos visíveis de solidariedade, jornadas de oração pública…»  (Respostas aos jornalistas – 14.Set.)
- «(S)ó o perdão dado e recebido coloca os alicerces duradouros da reconciliação e da paz para todos. É necessária a transformação nas profundezas do espírito e do coração para reencontrar uma certa clarividência e imparcialidade, o sentido profundo da justiça e do bem comum. Um olhar novo e mais livre tornar-nos-á capazes de analisar e questionar sistemas humanos que levam a becos … a fim de se avançar tendo em conta o passado para não mais o repetir.» (Encontro com Governo – 15.Set..)
- «O perdão e a reconciliação são caminhos de paz, e abrem um futuro. Descobrir verdadeiramente o perdão e a misericórdia de Deus, permite sempre recomeçar uma vida nova. (Cristo) venceu o mal não com outro mal, mas tomando-o sobre Si e aniquilando-o na cruz com o amor vivido até ao fim.» (Encontro com os Jovens – 15 Set.)
- «Só o humilde pode saborear as delícias de uma paz inaudita. (…) (A) paz é, primariamente, um fruto do Espírito, que é preciso pedir a Deus sem cessar.»  (Exortação, ponto 10)
- «A eficácia do compromisso a favor da paz depende do conceito que o mundo possa ter da vida humana. Se queremos a paz, defendamos a vida. (…) Portanto, devemos unir os nossos esforços para desenvolver uma sã antropologia que integre a unidade da pessoa. Sem isso, não é possível construir a paz autêntica.» (Encontro com Governo – 15.Set.) 

OS FUNDAMENTALISMOS ADULTERAM QUALQUER CRENÇA
- «O fundamentalismo é sempre uma falsificação da religião. Vai contra a essência da religião, que quer reconciliar e criar a paz de Deus no mundo.» (Respostas aos jornalistas – 14.Set.)
- «Sabemos que o encontro entre o islão e o cristianismo assumiu muitas vezes a forma de controvérsia doutrinal. Infelizmente, estas diferenças doutrinais serviram de pretexto a uns e a outros para justificarem, em nome da religião, práticas de intolerância, discriminação, marginalização e até de perseguição.» (Exortação – ponto 23)
- «(O)s muçulmanos partilham com os cristãos a convicção de que, em matéria religiosa, não é permitida qualquer coacção, e menos ainda com a força. A referida coacção, que pode assumir variadas e insidiosas formas no plano pessoal e social, cultural, administrativo e político, é contrária à vontade de Deus; é uma fonte de manipulação político-religiosa, de discriminação e violência que pode levar à morte. Deus quer a vida, não a morte; Ele proíbe o homicídio, incluindo o do homicida.» (Exortação – ponto 26)
- «Utilizar as palavras reveladas, as Sagradas Escrituras ou o nome de Deus para justificar os nossos interesses, as nossas políticas tão facilmente complacentes ou as nossas violências, é um erro gravíssimo (Exortação – ponto 30)

Fica para daqui a 15 dias as reflexões de Bento XVI sobre as encruzilhadas do Médio Oriente e outros temas candentes. 

Maria Zarco
(a  preparar o próximo gin tónico, para daqui a 2 semanas)
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