11 agosto 2014

Dos sacrifícios e do amor

Fotografia de JMAC, o homem de Azeitão

No livro "O Conceito de Amor em Santo Agostinho" (tema de base da sua tese de doutoramento) Hanna Arendt diz este frase luminosa: só a caridade é que está em condições de realizar esta renúncia a si, pois é apenas no amor que é dado o porquê do sacrifício. Peguei na frase, copiei-a e enviei-a a duas pessoas: uma, a quem costumo enviar estas pequenas dádivas com que me cruzo; a outra, porque passa por um momento conjugal mais desafiante. Em ambos os casos há uma certa ingenuidade - que entendam o envio, na total diferença da minha motivação.

Ler Santo Agostinho é ler o amor pelo próximo e pelo mundo, o amor de Deus, por Deus, com Deus - no pensamento, no coração, na ponta dos dedos. Ler Santo Agostinho (ou quem sobre ele se debruçou profundamente) é, acima de tudo, um olhar elevado aos céus. Imaginemos agora que eu punha aqui a frase sem citar o autor nem o enquadramento. Que ideia reteríamos deste alinhamento de palavras e, sobretudo, do seu final: ... pois é apenas no amor que é dado o porquê do sacrifício. A frase, estou certo, é um ensinamento de vida, quer se seja cristão ou ateu. Percebê-la é perceber uma via mais doce. 

Entremeio outra frase, esta de Cesare Pavese, que apanhei num blogue e também partilhei: todo o sofrimento que não seja ao mesmo tempo conhecimento é inútil. De repente, num fim de tarde de domingo, com os cães a ladrar ao longe, encontrei um paralelismo entre a frase do escritor e a frase da filósofa. Se o sofrimento é inútil caso dele não se tire conhecimento, também o sacrifício é inútil se nele não houver amor. E em havendo amor, todo o sacrifício é caminho de conhecimento que nos conduz à perfeição. 

Se Roland Barthes fosse vivo, talvez lhe escrevesse sobre esta ideia do punctum. Afinal, um detalhe bem escolhido pode ser uma arma contra a barbárie que nos habita.

JdB 


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