24 agosto 2016

Textos dos dias que correm

O grito e o eco

«O grito solitário não tem valor, por muito amplo que seja o seu eco», escreveu José Carlos Mariátegui, escritor peruano de forte impacto social que morreu com apenas 39 anos, em 1930, em Lima.

Estas palavras tocam-me, até porque durante as férias é fácil ouvir no silêncio das montanhas um grito solitário que se espalha pelos vales, transportado pelas ondas sonoras do eco.

O autor sul-americano recorda-nos um princípio que vale um pouco para todos, e não só para os grandes da história. Se alguém retém exclusivamente para si o tesouro de inteligência e de humanidade que recebeu e o faz brilhar apenas sobre o cume isolado da sua interioridade ou de um cenáculo restrito, no fim torna-se semelhante àqueles que enterram em lugares inacessíveis um tesouro de ouro que a muitos poderia matar a fome.

O isolamento altivo e desdenhoso não é uma tentação só do intelectual, mas é também, muitas vezes, o resultado comum de muito egoísmo ou indolência e até de soberba.

Os grandes artistas, os fundadores, os santos desceram sempre do cume da sua criatividade, da torre de marfim da sua experiência, da floresta mística, para oferecer as suas obras a quem vivia no cinzentismo do dia a dia ou na miséria, fazendo assim florescer a beleza, a verdade, o amor. Ainda que pequena seja a nossa voz e o seu eco, não a enclausuremos entre quatro paredes.


P. (Card.) Gianfranco Ravasi
In "Avvenire"
Trad. / edição: Rui Jorge Martins
Publicado aqui em 22.08.2016

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