Depois de ter sido eleito para o Conselho de Curadores ou Conselho de Administração (Board of Trustees) da Childhood Cancer International, encetei algumas conversas com colegas com quem tinha mais confiança, com quem havia uma empatia mais acentuada. O objectivo era simples: ter informações mais ou menos privilegiadas, de quem estava por dentro da organização; saber o que corre bem, o que pode ser melhorado; o que são as sensibilidades das várias pessoas, como se articulam, de volta da mesma mesa, realidades tão distintas como EUA, Chile, Índia, Espanha, África do Sul, Nova Zelândia ou Austrália; por último, mas não menos importante, tentar saber porque me convidaram para o lugar, uma pessoa que intervém pouco nestas conferências internacionais, mas cuja presença se destaca pelo tamanho.
Tenho 20 anos de cultura de multinacional. Sei o que são os jogos de poder, as estratégias pessoais, as pequenas ou grandes traições, as lutas por uma promoção ou por uma notoriedade. Vivi essa realidade, fui vítima ingénua dessa realidade. O meu mindset mudou bastante quando entrei no mundo das IPSS, onde não havia razão para essas trapalhices. Afinal, todos lutávamos pelo mesmo: o bem-estar do nosso semelhante, no meu caso crianças indefesas. Qual não é o meu espanto, portanto, quando no decorrer de uma conversa com um colega com quem / por quem tenho à-vontade, confiança e simpatia e respeito, ele me diz de fulano: tem uma agenda pessoal. E depois me diz de beltrano: tem uma agenda pessoal. E em conversa com outro colega ele me diz de sicrano: tem muito poder nos bastidores. O que são as agendas pessoais? Simplesmente ambicionar um lugar mais importante na organização, tantas vezes à custa de mais trabalho, nem mais dinheiro nem mais estatuto que lhe valha.
Sou um ingénuo. Dei por mim esquecido de que onde há Homens há fragilidades ou desejos ou motivações. Achei que o mundo era mais perfeito (e não deixa de ser por causa destas pessoas específicas) e que, quando se trata de solidariedade, todos damos a camisa pelo nosso próximo, nem que para isso tenhamos de ver outro mortal com a sua camisa vestida. A minha ingenuidade talvez advenha do facto de não ter qualquer agenda pessoal - não quero, na realidade, ser mais do que aquilo que sou, porque a minha vida e a minha vontade, diga-se em bom rigor, também não o solicitam. Estou bem em ser presidente de x e membro da direcção de y, mas também estou bem se deixar de ser. A minha vaidade é outra, as minhas aspirações são outras. Levo a mal as ambições dos outros? Não, se isso não implicar falta de ética.
Ontem jantámos - éramos cerca de 50 pessoas - como parte da conferência que juntará, nos próximos dias, associações de pais, sobreviventes, médicos, profissionais de saúde e outros para falar sobre a oncologia pediátrica em África. Olhei para todos, até para aqueles de quem me disseram ter uma agenda pessoal ou muito poder nos bastidores. Não vi nada. Vi apenas, juntamente com os outros companheiros de guerra, uma vontade e uma dedicação à causa. Vi apenas espírito de serviço, vontade de ajudar quem sofre num hospital quando devia brincar numa escola. Talvez a agenda pessoal dessas pessoas seja essa, temperada por uma saudável ambição que nunca matou ninguém.
JdB
Conserve-se assim ingénuo e tire partido dessa viagem, dessa função, enfim viva as oportunidades plenamente!
ResponderEliminarBeijinhos