No rescaldo da tragédia do incêndio que deflagrou neste Sábado, durante (talvez causado pel’) a trovoada seca, fica-se sem palavras. O horror do número galopante de vítimas mortais, no interior do país, nem dá para acreditar. Pedrogão Grande está de luto e com ele todo o país.
É a hora do silêncio ou da música mais profunda, capaz de exprimir o que já não está ao alcance das palavras, depois de uma multidão ter sido devorada pelas chamas.
O pianista e compositor russo Rachmaninov (Rússia 1873-1943 EUA) – que foi aluno de outro génio da música, Tchaikovsky (Rússia 1840-1893) – escreveu concertos para piano e orquestra que elevam a dor a um patamar sagrado, onde o horizonte infinito desconhece os limites da condição terrena. Ainda que não ofereça a solução prática (e indispensável), pode ser consolador e, sobretudo, inspirador para quem enfrenta um desgosto, uma nova dificuldade. De facto, não há soluções que dispensem o envolvimento directo das pessoas atingidas.
Voltando a Rachmaninov: é consensual reconhecer que as suas árias estão impregnadas de espiritualidade. Segundo testemunha o violinista Gidon Kremer: «Entra-se num espaço espiritual onde cada emoção é permitida, mas a principal é familiar a todos e está ligada ao amor. (…) Tocar a sua música é como participar numa missa.» O próprio russo, marcado por uma vida bastante tormentosa, colocava o amor no âmago da expressão artística: «A poesia [como a música] nasce do coração e dirige-se ao coração. É amor. A poesia é irmã da música, e mãe do sofrimento».
Especificamente, o segundo andamento do célebre Concerto nº 2 para Piano, Op. 18, contém passagens de uma beleza, que nos lava por dentro. Profundamente libertador, foi alvo de adaptações posteriores. É o caso da composição do violinista judeu-austríaco Fritz Kreisler (1875-1962), que parte da peça do russo para a assumir como oração. Escolheu para título o termo italiano «Preghiera» reduzindo a orquestração portentosa do original a um trio virtuoso de violino, piano e violoncelo:
É a hora do silêncio ou da música mais profunda, capaz de exprimir o que já não está ao alcance das palavras, depois de uma multidão ter sido devorada pelas chamas.
O pianista e compositor russo Rachmaninov (Rússia 1873-1943 EUA) – que foi aluno de outro génio da música, Tchaikovsky (Rússia 1840-1893) – escreveu concertos para piano e orquestra que elevam a dor a um patamar sagrado, onde o horizonte infinito desconhece os limites da condição terrena. Ainda que não ofereça a solução prática (e indispensável), pode ser consolador e, sobretudo, inspirador para quem enfrenta um desgosto, uma nova dificuldade. De facto, não há soluções que dispensem o envolvimento directo das pessoas atingidas.
Voltando a Rachmaninov: é consensual reconhecer que as suas árias estão impregnadas de espiritualidade. Segundo testemunha o violinista Gidon Kremer: «Entra-se num espaço espiritual onde cada emoção é permitida, mas a principal é familiar a todos e está ligada ao amor. (…) Tocar a sua música é como participar numa missa.» O próprio russo, marcado por uma vida bastante tormentosa, colocava o amor no âmago da expressão artística: «A poesia [como a música] nasce do coração e dirige-se ao coração. É amor. A poesia é irmã da música, e mãe do sofrimento».
Especificamente, o segundo andamento do célebre Concerto nº 2 para Piano, Op. 18, contém passagens de uma beleza, que nos lava por dentro. Profundamente libertador, foi alvo de adaptações posteriores. É o caso da composição do violinista judeu-austríaco Fritz Kreisler (1875-1962), que parte da peça do russo para a assumir como oração. Escolheu para título o termo italiano «Preghiera» reduzindo a orquestração portentosa do original a um trio virtuoso de violino, piano e violoncelo:
Claro que a obra de Rachmaninov não é menos intensa na sua riqueza polifónica, extremamente delicada e aqui magistralmente dirigida pelo maestro Claudio Abbado, com o solo do piano interpretado pela instrumentalista francesa, que também se dedicou à protecção dos lobos – Hélène Grimaud. São 11 minutos especiais:
Como diz uma outra oração de milénios anteriores: há uma hora para falar e outra para calar; uma hora para chorar e outra para rir; uma hora para lembrar e outra para esquecer. Também para Pedrogão Grande haverá um tempo para as lágrimas e outro para a reconstrução, sabendo que conta com um país a mobilizar-se para dar o melhor apoio. Aliás, não têm faltado gestos generosos e profissionais, inclusive vindos de outros países, para mitigar a violência inaudita deste incêndio, em território nacional.
O fogo mais mortífero das últimas
décadas, agravado pela recusa de muita gente em abandonar a casa, apesar do
perigo iminente, além dos c. 30 automobilistas
apanhados numa via que se tornou num inferno. Um piloto, envolvido no combate
aéreo, fala de uma junção terrífica e invulgar de fenómenos naturais: um
relâmpago a atear as chamas, ventos de rajada a espalhá-las em todas as direcções e
sequência de dias com temperaturas elevadíssimas.
Maria Zarco
(a preparar o próximo gin tónico, para daqui a 2 semanas)
Muito bom, porque sóbrio.
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