Volto ao tema do desporto o que, em mim, pode revelar uma perturbação preocupante: duas vezes no espaço de escassos dias!?
Uma ida ao Decathlon obedece a uma motivação principal e uma secundária: a procura de um determinado equipamento, seja para utilização própria, seja para cumprir uma encomenda ou manifestar uma generosidade. Ora, como a loja é de desporto, ninguém se dirige àquele estabelecimento para comprar courgettes biológicas, o último livro de um determinado escritor ou uma camisa de noite sensual. Quem vai à Decathlon vai à procura de artigos desportivos - isto parece-me um grande lugar-comum. Esta é a motivação principal.
A motivação secundária, que se agarrou a mim como um boia de salvação, foi a exploração sociológica. Arredado que estou, felizmente, do desejo de aquisição de capacetes de bicicleta, camisetas caviadas, bolas de futebol ou raquetes de praia, resta-me olhar para quem o faz. Quem são as pessoas, o que fazem, como se comportam, o que procuram? Vi gente local e gente estrangeira com interesses diversos aparentes - férias na praia, substituição de equipamentos, subida de patamar ao nível da compleição física. Eram pessoas mais ou menos elegantes (até nas meninas da caixa não há adiposidades) e / ou musculadas, com ar de quem cultiva meticulosamente o físico (e cito um pensamento muito antigo).
Eis senão quando me confronto com uma família composta por (parecia-me) pai, mãe e filho. Nada disto é muito estranho, a não ser o facto de pesarem, cada um deles, bem para além dos 100 kg. Diz-me pessoa sabedora que aquela gordura é da comida, não de um desarranjo genético ou hormonal. E, confesso, gostei de os ver e de imaginar a cena: a compra de um aparelho que trabalha ao nível do abdominal, umas cintas que, presas no ramo alto de um pinheiro, permitem trabalhar vários músculos em simultâneo, dinamizar o equilíbrio e melhorar a postura, que as vidas de hoje são sedentárias. Os três, cada um com o seu carrinho, percorrem vagarosa e atentamente os corredores, procurando a melhor relação custo - benefício, ouvindo os funcionários que partilham a sua experiência de cross aos fins de semana, ou as histórias de uma prima que ganhou prémios numa agremiação dos arrabaldes da Chamusca.
Depois, gasto o subsídio de férias em artigos com hipótese de troca mediante apresentação do talão, dirigem-se ao shopping mais próximo, que já são horas de almoço. Aí, sentados a uma mesa de plástico, afagam o estômago como quem consola um órgão debilitado. Olham em redor, atentando com os olhos no que vão comer. Escolhem um hamburger com batatas fritas e refrigerante, mas não escolhem sobremesa, porque suspeitam que tem lactose e já lhes disseram que isso pode fazer mal. Escolhem antes um bolo com a bica cheia em chávena fria, que o folhado (disse-lhes um primo) não tem glúten.
Há uma parte da minha vida que difere profundamente dos hábitos perniciosos desta família obesa e mal informada: eu nunca vou ao Decathlon.
JdB
Desta vez fez-me sorrir. Por feitio, sou observador. Claro que isto tem um alto preço: reparo nos anúncios de rua e nas paragens de autocarro e concluio que este povo é mesmo analfa_beto_bruto_etc.
ResponderEliminarAté ter que trabalhar, só pratiquei esforços na bicicleta pasteleira, no ping-pong e no ténis. Mas nunca fisgado em vencer. No Liceu, odiei as aulas (obrigatórias) de Educação Física e baldei-me, educadamente, ao Ginásio Clube Português, então para os lados da Calçada do Ferragial — meu Pai só dizia as coisas uma vez mas desculpava mil vezes.
Agora, velho e doente, peocupa-me a barriga e o cansaço. Mas, vade retro, nunca irei a um ginásio. Como nem posso 'correr até ao enfarto', não ando a fazer figura de palhaço nas marotÔnas para séniores.
Abraço,
ea
ea,
ResponderEliminarObrigado pela sua (continuada) visita.
Por vezes o espírito observador é um entretém, por vezes é uma porta para a maledicência - ou apenas para a falta de caridade. Não fui educado para o desporto, nunca passei de mediano no futebol, no voleibol ou no ping-pong. Por vezes era seleccionado para equipas do liceu, e os motivos de me escolherem um mistério ainda insondável.
Lamento a sua "barriga e cansaço". Mantenha o sentido de humor, que é uma forma de compensação...
Abraço,
JdB
Não consigo parar de rir
ResponderEliminarHá quem diga que tudo é uma questão de cabeça.
óh pá tu consegues, o que interessa é a tua cabeça....
este trio estava a caminho do convencimento. Estava em estágio mental porque a "bem dezer" o que conta é a intenção.