22 fevereiro 2021

Duas Últimas

Gosto de António dos Santos, penso que já o disse aqui há bastante tempo. Um dia "apresentei-o" aos meus filhos que, penso, terão tido o que poderia ser um refluxo gástrico de tão espantados ficaram com um homem cuja batida da viola é sempre igual, com aquela voz grave e dolente que afugenta os mais precavidos. 

António dos Santos cantou versos muito bonitos, nomeadamente de Mascarenhas Barreto. Não são esses que trago. O que apresento ao meus fiéis leitores tem letra (e música) dele. Porquê este? Talvez para que André Ventura perceba que a guerra aos ciganos (parece que agora se diz 'comunidade cigana') já provocou muita infelicidade, nomeadamente ao malogrado fadista. Basta atentar na letra.

JdB


 

Ilusão Perdida

Amei uma vez na vida,
Mas não pude ser amado
Por uma formosa cigana;
Era de raça diferente,
Diferente a sua cor
E tinha uma lei tirana.

Disse-me um dia, a chorar,
Essa linda ciganita:
"Perdoa-me, meu amor!
Jamais poderei ser tua
Porque só posso casar
Com alguém da minha cor!"

A soluçar, concordei,
Enchi-lhe a boca de beijos,
Foi a nossa despedida;
E com a raiva nos olhos
Vi partir a caravana
Que levava a minha vida.

Não mais a tornei a ver,
Não sei se vive, se é morta,
Se anda pelo mundo fora;
Se lá longe, muito longe,
Me tenta agora esquecer
Como eu a recordo agora.

Nunca mais amei no mundo
A ninguém um só momento;
Já pouco me importa a vida:
Sou monge, um vagabundo
Encerrado no convento
Da minha ilusão perdida.


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