14 janeiro 2009

Largo da Boa-Hora

Hoje uso o meu banco como tribuna para gritar, desculpem:

A globalização é uma mentira, um embuste, uma ilusão.

O que se globalizou foi, específica e exclusivamente, a produção, distribuição e consumo de bens e serviços, e a informação.
Mercados e notícias, nada mais.
Não se globalizaram os valores, elementares e essenciais, como o direito à vida, dignidade, liberdade, fraternidade, solidariedade, família, trabalho, saúde, educação e cultura, pensamento, religião, protecção de pessoas e bens, justiça e paz, e todos os demais que formam o acervo mínimo e indispensável para que a Humanidade seja humana.
Todos esses valores estão plasmados, fixados sob forma de lei, na Declaração Universal dos Direitos do Homem (adoptada e proclamada pela Assembleia Geral das ONU na sua Resolução 217-A (III) de 10 de Dezembro de 1948).
Do mesmo modo que estão revelados, ensinados e sacralizados em todas as religiões e seus textos sagrados ou anunciações.
Também todos eles estão, no fundo, subjacentes aos pensamentos políticos e filosofias que estruturam estados e culturas.
Mas, e é o mais importante, todos esses valores são naturais e inatos ao ser humano, a cada um dos homens. Todos os sentem, reconhecem e reclamam; são tão elementares e inerentes ao Homem que são, na verdade, do senso comum.
Ora, sendo tão naturais e evidentes estes valores, deveriam ser eles - tivesse a humanidade cumprido o caminho certo da sua evolução - os prioritários e os pioneiros da globalização, e há muito seriam comuns, como hoje o são os mercados e a informação.
Fosse assim, fosse a globalização a generalização dos bons valores, e o Mundo seria um éden, em vez deste inferno.
Mas o Homem escreveu e continua a escrever uma História errada, medíocre e perversa.
Há milhares de anos que falha, porque não consegue realizar o mais essencial, mais fundamental, o verdadeiramente crítico, que é precisamente o de globalizar os valores da condição humana.
A história do Homem não avança no caminho para a perfeição, para a realização de ideais, para a mais completa e perfeita concretização da condição humana, para o Bem. Ao invés, gira em círculos de repetição dos mesmos holocaustos.
O colectivo humanidade é absurdo.
Pergunto-me porque será assim. Só encontro uma resposta plausível e convincente: tudo se reconduz a uma luta entre o Bem e o Mal que é travada desde os primórdios, e o que é verdade é que o Mal ganha muitas vezes, repetidamente e em momentos cruciais. Nas grandes oportunidades de viragem do rumo da história, o Mal consegue minar e destruir essa tendência e reverter o bom caminho encetado.
O Bem dispõe e esgrime com o Amor e o Mal dispõe e esgrime com o Ódio.
Ora, o que temos de concluir é que o ódio consegue impor os seus ditames de violência, guerra, dor, morte, destruição, sofrimento, criando geografias de barbárie, de devastação, de aniquilamento.
O ódio, motor da desgraça, germina onde falta o amor, reproduz-se como a mais violenta epidemia, e não tem cura. Quando instalado, não há como o remover - apenas se consegue circunscrever e neutralizar.
Importa, pois, não lhe dar oportunidade de florescimento, ou seja, preencher o tempo e o espaço, todo, com o Amor que o aniquila e impede.
Não estou a ser lírico, nem utópico. Estou consciente e lucidamente a lançar um manifesto, mesmo que solitário, de que a alternativa, a única, é a revolução, isto é, munidos do amor, ao serviço do bem, vamos globalizar os valores inatos ao Homem.
Partamos à conversão e pacificação onde o ódio germina e floresce como praga e epidemia, e comecemos a revolução da globalização dos bons valores.
Não haja ilusões. Se tomarmos esta bandeira a sério e devotadamente, muitas das concepções e modelos políticos, económicos, sociais, entre tantos outros paradigmas que agora ainda são os nossos, vão sofrer modificações, inovações, substituições.
Cumpre-nos dar nova esperança, oportunidade à História. Devemos aproveitar o momento em que alguns dos nossos próprios alicerces ruíram (mercados, emprego, segurança social e outros) para revolucionar e avançar de encontro aos outros, levando a nossa proposta de construção de um mundo, que, pela sua simplicidade e naturalidade à condição humana, tem condições de ser acolhida ou pelo menos influenciar a que, finalmente, os homens peregrinem juntos na terra.
Se conseguimos globalizar os mercados e a informação, será que não conseguiremos globalizar os bons valores?

ATM

5 comentários:

  1. Ainda há quem procure fazer o Bem, gastando todas as forças no serviço dos outros.
    Mas desde os tempos do Paraíso que o Bem tem dificuldades...
    O Homem e a sua natureza..
    fq

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  2. É assim mesmo, assim é que é falar/escrever!!

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  3. ATM, esta preocupou-me. Valores naturais e inatos? Quais são os valores da condição humana? O que é o bem e o mal? Amor, ódio. Tantos conceitos abrangentes, desconsensuais, interdisciplinatres e tão pouco universais, que passaríamos o resto das nossas vidas a procurar as suas comunalidades e a torná-los globais. No entanto, para nós ocidentais, portugueses, católicos e burgueses que seja então legítima e "natural", a defesa e a apologia da globalização dos bons valores. Volte sempre.

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  4. E já agora, porque não uma Bolsa de (Bons) Valores ? Eu investiria na certa :-)

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  5. Fiquei a pensar no seu texto...
    Pergunto-me se de facto o mundo não avança, não progride em relação ao Bem..e eu penso que temos individual e colectivamente progredido (não o que seria ideal) relativamente ao que já fomos como povos, bárbaros e sanguinários...claro que ainda temos facções assim....mas não tenho essa visão negativa, vejo-nos mais como um povo à procura, muito perdido ainda, mas com muitos farois pelos caminhos a apontar direcções...
    Sempre haverá o Mal...tendencialmente irá diminuir...

    Julgo que a falta de esclarecimento das consciências, leva à falta de autoresponsabilização em todo o processo evolutivo.

    Enquanto não for entendido e arreigado determinadas e incontornáveis leis Universais a que todos estamos sugeitos, muito mal será feito...porque ou se crê na salvação pós-morte, ou não se acredita que mais nada exista, e bem se está...
    A partir do momento que nos sabemos uma parte da Energia de um Todo (...)e sabemos que aquilo que fizermos aos outros, voltará para nós(...), cada pequeno gesto, pensamento, conta...para a nossa felicidade ou infelicidade, para a saúde ou doença, para...

    Os círculos de repetição, são necessários quanto a mim, precisamente para mexer com as consciências (colectivas e individuais ) no sentido de se alterarem padrões enraizados de pensamentos e hábitos.
    Se repararmos esses círculos de repetição passam-se nas nossas vidas, no nosso microcosmo existêncial, passam-se esses ciclos repetitivos e destrutivos, até nós em consciência o percebermos, analisarmos e entendermos que já não nos servem esses padrões e que precisamos de os deitar fora e mudar...MUDAR, MELHORAR, CRESCER, AVANÇAR noutra direcção.
    Tarefa árdua, de todos os dias. Fazer/Ser o Bem diáriamente, mas muito gratificante.
    Convenhamos que é muito mais fácil, praticar o mal, e ele pode começar por pequenas e insignificantes coisas, mas vai ganhando corpo e volume, se se apanha solto..

    É que praticar o Amor, é moroso nos corações empedernidos ou habituados a Não Ser, é subtil, mas tal como a água mole em pedra dura...vence. O Humor, a Alegria, o Perdão, a Tolerância, trabalham todos juntos, em prol de um Bem comum. Mas tal como já disse uma vez por aqui, essa tarefa começa de dentro para fora, em nós, em casa, na rua, na cidade, no país, no mundo.

    Enquanto não olharmos para o vizinho que cospe para o chão, chama nomes à mulher, ... e virmos UM IRMÃO, apesar de todos os seus defeitos (...) e percebermos ( humildemente, sem soberba ) que ele ainda tem muito para andar (tal como nós noutros sentidos), e talvez com o nosso exemplo, palavra, gesto, ele um dia repare nesse ciclo negativo em que caiu e o corrija.
    Enquanto não nos virmos como parte coesa/responsável do Todo que somos, não avançaremos.

    (conhece a história do Srooge? de Charles Dickens, é apenas uma Bela história que ilustra um pouco do que aqui disse. É também uma história de Esperança, de Redenção, do triunfo do Amor)

    A construção do mundo passa pela reestruturação/requalificação do Mundo, sim.
    E as estruturas ruem, precisamente, para nos dar oportunidades nesse sentido...apesar de gerar desiquilibrios, tensões, medos, ....
    Cabe-nos carpir desgraças e sofrer, ou aceitar as mudanças e fazer parte positiva delas.

    Estou em crer que grande parte irá conseguir.

    Um abraço

    a.

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