20 janeiro 2010

A corrida

O ser humano é poderoso, exerce um domínio quase pleno sobre o seu mundo. No entanto, há algo que o transcende: o tempo. foge-lhe pelas entranhas dos dedos e, por mais firme que seja o cerrar da mão, desaparece, numa corrida exaustiva, onde a meta é a morte. Somos, portanto, atletas que corremos ao ritmo acelerado da vida, ofegantes, com a mente no próximo passo, no próximo obstáculo, no próximo triunfo. Depressa pisamos o passado, tamanha é a obsessão pelo futuro. Corremos velozmente, de cabeça erguida, olhos focados, esforços empregues no próximo passo. E os anteriores, aqueles que nos gastaram a sola do sapato, aqueles que construíram o nosso caminho até ao presente, aqueles que nos edificaram? Ficaram para trás, deixando apenas a sua marca na terra que o tempo acabará por apagar.

A corrida continua e, à medida que o tempo vai passando, o atleta amadurece, começa a reduzir o ritmo, a fugir da meta. Todavia, a vida é uma estrada de sentido obrigatória e ele tem de continuar, começando, no entanto, a baixar o olhar e a arquear as costas. O desânimo invade-o, perdeu as forças para correr e agora é apenas um atleta em marcha. Pressente que a meta está perto e tem uma vontade repentina de reviver toda a sua corrida. Porém, quando pela primeira vez olha para trás, vê um caminho de terra sem qualquer marca pessoal. O tempo apagou tudo.

Agora, com a meta ao alcance do olhar, o atleta percebe que a vida é constituída por passado, presente e futuro. Arrepende-se tremendamente de ter posto para trás das costas cada passo que deu e, já de joelhos no chão, numa tentativa de deixar uma marca eterna, apela aos outros atletas que registem a sua vida, no desespero de não ter feito o seu diário.

MTM

2 comentários:

  1. Somos pó, não é MTM? Porque haveríamos nós de deixar marca na Terra? Espera-nos a Verdadeira Vida (essa sem passado, presente ou futuro). Só Glória. A glória que a maior parte de nós não obteve na Terra. Obrigada. pcp

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  2. É verdade: o tempo que não dominamos. A frase é admirável e foi Julien Green quem a escreveu:«Passamos todos os anos, sem o saber, pela data da nossa morte», ainda que esta seja a única certeza em que não se acredita.
    Contudo esperamos e desejamos que essa meta esteja muito longe, não é verdade?
    Parabéns pelo texto.

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