05 novembro 2011

Pensamentos impensados


(...) Tratava-se, como sempre, da Alfândega, fonte perene das suas amarguras! Agora tinha encalhado um caixote, contendo uma múmia egípcia.
- Uma múmia!...
Sim, precisamente, uma múmia histórica, o corpo verídico e venerável de Pentaour, escriba ritual do templo de Amnour em Tebas, o cronista de Ramesses II.
(...) Mas, apesar de esforços sagazes não conseguia arrancar o defunto letrado aos armazéns da Alfândega, que ele enchera de confusão e de horror. Logo na primeira tarde, quando Pentaour desembarcara, enfaixado dentro do seu caixão, a Alfândega, aterrada, avisou a polícia. Depois, calmadas as desconfianças de um crime, surgira uma insuperavel dificuldade:--que artigo da pauta se poderia aplicar ao cadáver de um hierogramata do tempo de Ramesses?. Ele, Fradique, sugerira o artigo que taxa o arenque defumado. Realmente, no fundo, o que é o arenque defumado senão a múmia, sem ligaduras e sem inscrições, de um arenque que viveu? Ter sido peixe ou escriba nada importava para os efeitos fiscais. O que a Alfândega via diante de si era o corpo de uma criatura, outrora palpitante, hoje secada ao fumeiro. S ela em vida nadava num cardume nas ondas do mar do Norte, ou se, nas margens do Nilo, há quatro mil anos, arrolava as reses de Amnon e comentava os "capítulos de fim de dia"--não era certamente da conta dos Poderes Públicos (...)
  
(Eça de Queiroz, in Correspondência de Fradique Mendes)
 
Conforto
Não percebo por que não há casas no Polo Norte; poderiam ser tão quentinhas com todas a fachadas voltadas a Sul! Já no Polo Sul, percebe-se; um frio de rachar com todas as fachadas voltadas a Norte.
 
Tratamento radical
Queixava-se de falta de memória e aconselharam-lhe fósforo. Morreu pois comeu umas quantas caixas de fósforo.
 
Doçaria
Deram-lhe a provar um doce que estava óptimo. Foi o que pode chamar-se o bónus da prova.

SdB (I)

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