22 abril 2013

Vai um gin do Peter’s?


A riqueza da informação que hoje circula na net parece uma cascata inesgotável, puxando pelo melhor do ser humano, empenhado em partilhar informação útil. Um verdadeiro serviço público, de valor incalculável.

Depois do Rijksmuseum de Amesterdão, chegou a vez de outros museus (de Nova Iorque) oferecerem online centenas de livros. Com um simples clique, revisitamos exposições espectaculares, de há meio século, mas que em nada perderam o interesse e a actualidade.

Link do GUGGENHEIM, com 65 títulos sobre artistas como Klimt, Kandinsky, Francis Bacon ou Munch:

http://www.guggenheim.org/new-york/exhibitions/publications/from-the-archives?layout=default&filter_type=archive&reset=0&start=20

A título de exemplo, algumas das edições disponíveis:

A Century in Crisis:Modernity and Tradition in the Art of Twentieth-Century China

Contributions by Julia F. Andrews, Christina Chu, Shan Guolin, Mayching Kao, Kuiyi Shen, Jonathan Spence, and Xue Yongnian
Published in 1998
336 pages, fully illustrated
Hardcover

China: 5,000 Years,Innovation and Transformation in the Arts

Contributions by Helmut Brinker, James Cahill, Elizabeth Childs-Johnson, Patricia Ebrey, Sherman Lee, and Zhang Wenbin
Published in 1998
504 pages, fully illustrated 


Kandinsky in Munich:1896–1914

Contributions by Peter Jelavich, Carl E. Schorske, and Peg Weiss
Published in 1982
312 pages, fully illustrated
Softcover, 8.15 x 10 inches 



On the Spiritual inArt

Edited by Hilla Rebay
Published in 1946
154 pages, fully illustrated
Hardcover 



Link do MET:
http://www.metmuseum.org/research/metpublications/about-metpublications

Além da abundante produção editorial do Met, as próprias obras do seu acervo também são acessíveis através do portal, sem sairmos de casa. Para se ter uma ideia do ritmo frenético da actividade deste Museu, alguns parâmetros eloquentes: mais de 30 exposições por ano, publicação regular de periódicos de referência a nível mundial, profusão mensal de catálogos e livros de arte ombreando com a Taschen em qualidade.

Fundado em 1870, o Met tem procurado incorporar o máximo de avanços tecnológicos, para simplificar o acesso ao site e ampliar o seu público. Em 2000, lançou 2 publicações digitais: Connections e o cronograma Heilbrunn de História da Arte, com 300 cronologias, 900 ensaios e cerca de 7000 obras de arte, explicadas por técnicos do Museu. Connections dá a conhecer os pareceres e interpretações dos especialistas. 

O desafio mantém-se para aproximar o grande público da arte, informando-o gratuitamente, entusiasmando-o e envolvendo-o nos debates candentes ou no trabalho de detective dos historiadores para certificarem a autoria das obras-primas e contextualizá-las. Agora, já não é preciso viver na Big Apple para acompanhar a catadupa de novidades do Met e do Guggenheim. 


CONTRIBUTO ESPANTOSO DA GULBENKIAN

Também em Portugal há iniciativas que, com menos recursos, ajudam a divulgar a cultura e a ciência, através de exposições inspiradoras. «360º Ciência Descoberta» é disso exemplo. Está patente ao público até 2 de Junho, recomendando-se as visitas guiadas, que estão anunciadas no site da Fundação(1). Naturalmente que merecerá um gin específico, mas fica já o alerta para esta mostra espantosa, que revela o contributo da grande gesta dos Descobrimentos para a Ciência Moderna – um feito desconhecido da maioria dos portugueses.

De facto, a história nacional tem oscilado entre a apologia de um par de figuras maiores, elevadas a heróis míticos, e o desacreditar das possibilidades do país, numa variação bipolar que, desde meados do século XVIII, toca os dois extremos. Tudo muito emotivo, simplista e fundamentado em convicções com pouca ou nenhuma base científica.

Nesse sentido, «360º» tem o mérito de desvendar uma dimensão bem realista (mas ignorada) da história, que segue uma linha hoje em voga nos meios académicos anglófonos, ao reconhecer a importância da sociedade no seu todo, i.e. a influência do cidadão comum e anónimo no curso dos acontecimentos, sem se restringir ao papel desempenhado pelos líderes e demais autoridades instituídas.

Começando pelas peças medievais e evocando referências da Antiguidade clássica, «360º» revela as raízes dos famosos avanços científicos do século seguinte, impossíveis e até inexplicáveis sem a progressão do saber gerada pelos Descobrimentos portugueses e espanhóis. Até aqui, a história da ciência costumava fixar-se nas figuras de proa do século XVII em diante, maioritariamente britânicas, holandesas ou de outras nacionalidades bem distantes dos países peninsulares. Mas omite um fenómeno inédito, ocorrido durante e por causa dos Descobrimentos marítimos.

Com o início da navegação arriscadíssima em alto mar –abandonando as águas seguras do Mediterrâneo – a prática náutica passou a exigir aos membros comuns da tripulação dos galeões lusos o uso de fórmulas matemáticas e a  manipulação de instrumentos sofisticados, necessários para o cálculo preciso de localizações e a identificação dos melhores rumos. Tudo tarefas vitais nas viagens em pleno oceano. Como costuma alertar o Comissário da exposição (Prof.Henrique Leitão): temos de desfazer o mito do povo de aventureiros, que enfrentou as agruras do Atlântico em cascas de noz, adoptado por uma certa narrativa da história pátria, bem intencionada mas pouco factual. Ao invés, tratou-se de um empreendimento muitíssimo preparado, com décadas de antecedência e sustentado por uma sólida formação técnica, marcada pelo rigor e pela acumulação de saber (obviamente, em segredo de Estado), que permitiu a várias gerações de portugueses percorrer caminhos nunca antes navegados, e que só se abriram a outros países (bastantes anos depois), quando conseguiram ter acesso aos conhecimentos náuticos precocemente dominados pela marinha portuguesa. Durante todo o século XVI, assistiu-se ao afinar constante (e bem programado, sendo tudo anotado nos diários de bordo) de novas técnicas, favorecendo a rápida progressão marítima que espantava as outras potências da época. De facto, o nosso domínio dos mares foi alcançado a uma velocidade vertiginosa. Uma conquista notável e invulgar, que um historiador norte-americano especializado neste período considerava um salto qualitativo bem maior do que a chegada do Homem à lua. 

Assistiu-se também à democratização de saberes complexos, até à data confinados a uma elite ínfima, maioritariamente ligada ao clero, de onde derivaram para as universidades. A novidade estava no facto de simples marinheiros, praticamente analfabetos, manejarem a sextante como pouquíssimos faziam em terra firme… Era uma questão de vida ou de morte. Tinha razão Camões quando cantava: A necessidade aguça o engenho. Devemos também ao Poeta ter dado ampla voz a tanta gente anónima, esforçada e valorosa, que soube aplicar com acuidade e talento um vasto manancial de técnicas inovadoras, exigidas pelas circunstâncias.

«Vede, Ninfas, que engenhos de senhores
O vosso Tejo cria valerosos,
Que assim sabem prezar, com tais favores,
A quem os faz, cantando, gloriosos!» — Os Lusíadas, Canto VII«As armas

«As armas e os barões assinalados
Que, da ocidental praia lusitana,
Por mares nunca de antes navegados
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados,
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo reino, que tanto sublimaram.
.....
Cantando espalharei por toda a parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte.» — Os Lusíadas, Canto I

Além do Catálogo da exposição, de imensa qualidade e a preço simbólico, vale a pena espreitar o filme introdutório, em www.gulbenkian .pt.


Entre Lisboa e Nova Iorque, os programas superabundam.


Maria Zarco
(a  preparar o próximo gin tónico, para daqui a 2 semanas)
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