13 outubro 2014

Dos espelhos

Arcos de Valdevez, Setembro de 2014

Moments of Vision

That mirror
Which makes of men a transparency,
Who holds that mirror
And bids us such a breast-bare spectacle see
Of you and me?

That mirror
Whose magic penetrates like a dart,
Who lifts that mirror
And throws our mind back on us, and our heart,
until we start?

That mirror
Works well in these night hours of ache;
Why in that mirror
Are tincts we never see ourselves once take
When the world is awake?

That mirror
Can test each mortal when unaware;
Yea, that strange mirror
May catch his last thoughts, whole life foul or fair,
Glassing it -- where?

(Thomas Hardy)

***

Quando eu era criança,
falava como criança,
pensava como criança,
raciocinava como criança.
Mas, quando me tornei homem,
deixei o que era próprio de criança.  

Agora, vemos como num espelho de maneira confusa;
depois veremos face a face.
Agora, conheço de modo imperfeito
depois conhecerei como sou conhecido.

(1 Cor 13, 11-12)

***

Entre o espelho de S. Paulo e o de Thomas Hardy há dezanove séculos de ciência e de aperfeiçoamento do equipamento, se nos ativermos apenas à sua materialidade. No séc. I a nitidez seria reduzida, dezanove séculos depois a nitidez seria assinalável. E no entanto, não é de artigos domésticos que falam o santo e o poeta.
É curioso pensarmos no que são estes espelhos. Em S. Paulo, o espelho reflecte uma imagem confusa do que somos; em Thomas Hardy, a mesma expressão espelho é uma ferramenta que permite que nos desnudemos, nos tornemos transparentes. O que é o espelho do poeta inglês e, mistério dos mistérios, para onde espelha ele a visão que temos de uma vida, falhada ou justa? Já não falo do enigma que é saber quem segura o espelho.
A transparência é o resultado de um jogo de espelhos, retenho eu num caderno onde escrevo tudo o que oiço e que fica na memória, consiga eu entendê-lo ou não. E fixo também Pessanha, que diria: Imagens que passais pela retina / Dos meus olhos, porque não vos fixais?
Se eu ganhasse um euro por cada pensamento incompreendido – ou que não consigo desenvolver - teria já a atenção dedicada da máquina fiscal...
JdB

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