08 junho 2015

Da auto-ajuda ilhoa

Ribeira Grande, S. Miguel (Açores, Maio de 2015) 

Avancei para este post com uma certeza - a de que conseguiria encontrar uma fotografia bastante exactamente igual a esta, só que tirada quase nove anos antes e com uma máquina fotográfica diferente. Infelizmente não a descortinei e, no entanto, tenho a certeza de já ter visto este cartaz no mesmo sítio onde o encontrei agora.

Não fazendo qualquer juízo de valor relativamente às pessoas que frequentarão este espaço benfazejo, nem me pronunciando quanto à bondade das pessoas que colaboram para que se pare de sofrer, não deixo de achar curioso esta panóplia de problemas. Um bom artífice da palavra conseguiria construir uma história com todos eles - estamos desempregados e por isso contraímos dívidas e por isso tornamo-nos adictos e por isso temos inveja dos ricos.

Questiono-me se os tratamentos disponibilizados são ministrados individualmente ou em grupo. Se forem individualmente, não tenho tema. Mas se forem em grupo imagino o diálogo possível:

Olá, eu sou o Pedro e desmaio constantemente. Não sei se conseguirei acabar o raciocí...
Olá, eu sou o Manuel e vejo vultos. Às vezes é a minha professora da 4ª classe, às vezes é o homem do fraque...
Olhe, pois eu então oiço vozes. Ah, e sou o Amílcar...
Curioso... pois eu  - desculpem, chamo-me Odete - sou surda. E tenho inveja do Amilcar que ouve vozes.
Olha que graça, eu é problemas familiares. Por? Por causa da vizinha do 5º esquerdo que a minha esposa não grama. Que pedaço de mulher... Não disse o meu nome?

Conheço o suficiente da vida para ter respeito por toda a gente que sofre. Mas isto parece-me bizarro. Enfermidades? O que é isso? Dores de cabeça constantes não são enfermidades? Enquanto há sistema nacional de saúde, não seria melhor encaminhar esta gente para o médico local? Em nove anos o cartaz permaneceu num edifício bem cuidado da cosmopolita Ribeira Grande, um nome que me é familiarmente caro, sinal de que o edifício está devoluto ou que continua a haver gente que desmaia constantemente ou que tem nervosismo.

Haverá sessões online? É que tenho enfermidades várias, mas a vila açoriana não fica em caminho...

JdB

Nota: olhando com atenção para a jovem dobrada como um soluço (verso de um fado cantado pela Amália) pode ver-se um vulto. Não há que ter preocupações - é apenas o cavalheiro que tirou a fotografia...

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