felizes
felizes os pacíficos, que suspendem a violência
e reparam as redes de logradas fainas
(ai a guerra, mãe da pobreza e irmã da morte)
felizes os que aos olhos do mundo
passam por inútil carga social ou rendimento zero
e que escondidamente participam da alegria
que aligeira a vida
(ai aqueles que a sede de poder afoga)
felizes os pobres de alguma pobreza boa
felizes os que lavam as feridas e vivem com os cegos
honrando neles o fundo de humanidade
que lhes é comum
felizes os que nas situações-limite
decidem da singularidade do fazer, da urgência
felizes os que, excluídos, despojados de qualquer imagem
no documento mortal pregado na cruz
inscrevem os seus corpos
felizes os que, intacta, guardam a sensibilidade
à injustiça, apegados só à força da Palavra que cura
felizes os que não pactuam com os anjos
escuros da morte total
nem desculpam os «erros humanos»
das nossas sociedades sem olhos
(ai os que no inferno climatizado sobrevivem
ai o terror mole do dia a dia sobre os ombros)
felizes os que, à imagem de Deus, perdoam
alargando o coração às dimensões de um mundo abençoado
José Augusto Mourão
In "O nome e a forma", ed. Pedra Angular
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