29 fevereiro 2016

Textos dos dias que correm

O triplo filtro de Sócrates

Temos abundante consciência de que nas nossas conversas, muitas vezes, introduzimos temas que afetam outras pessoas: «Sabes o que é que aconteceu a fulano? Sabes o que me disseram de beltrano?». E começamos a fazer comentários sem estar seguros do que dizemos e na ausência da pessoa afetada. Fazemos em cacos a fama dessa pessoa e incorremos contra o oitavo mandamento, que nos diz: «Não levantarás falsos testemunhos nem mentirás».

Tão bem nos faria a todos cuidar mais da nossa língua e não falar mais do que a conta. E seria muito bom, o que nem sempre é fácil de fazer, comentar mais as coisas boas dos outros e felicitá-los por isso.

Vede que conselho tão sábio deu, no seu tempo, o filósofo grego Sócrates a um amigo que o abordou um dia, dizendo-lhe: «Sabes o que ouvi sobre o teu amigo?». «Espera um momento - replicou Sócrates -, antes de me falares sobre o meu amigo, pode ser uma boa ideia filtrar três vezes o que vais dizer. Por isso chamo-o o exame do triplo filtro.

«O primeiro filtro é a verdade: estás absolutamente seguro de que o que vais dizer-me é certo?» «Não - disse o homem -, na realidade ouvir falar sobre isso e...» «Bem - disse Sócrates -, então não sabes se é certo ou não. Permite-me agora aplicar o segundo filtro, a bondade: é algo bom o que me vais dizer sobre o meu amigo?» «Não - disse o homem -, pelo contrário.» «Então - respondeu Sócrates - desejas dizer-me algo de mal sobre ele, mas não estás seguro de que esteja certo. Mas ainda assim poderia querer ouvi-lo... Só que me falta o terceiro filtro, o da utilidade: serve-me de alguma coisa saber o que vais dizer-me do meu amigo?» «Não - disse o homem -, a verdade é que não.»

«Bem - concluiu Sócrates -, se o que desejas dizer-me não sabes se é certo, nem é algo de bom e inclusivamente não é algo útil para mim, para que quero sabê-lo?» Desta forma Sócrates cortou o comentário que pretendiam dizer-lhe sobre o seu amigo. Bonita maneira de cortar essa corrente tão perniciosa de comentários, de questiúnculas sobre os outros.

Que bom é saber vencer o escárnio sobre as coisas más dos outros! Que bom é não ouvir esses comentários nem os propagar! Se o praticássemos, seguramente a convivência entre famílias e entre vizinhos seria muito mais bela e harmoniosa. O papa Francisco recorda-nos muitas vezes que temos de evitar as críticas e as murmurações, pois são o caruncho da convivência.

Tomemos esse compromisso de não ouvir, de não propagar tudo aquilo que não sabemos se é certo, se não é algo bom nem útil para nós. Recordemos as palavras de Jesus: «Não julgueis e não sereis julgados, não condeneis e não sereis condenados».



D. Juan José Omella 
Arcebispo de Barcelona, Espanha 
Servicio de Información Católica 
Trad.: Rui Jorge Martins 
Publicado em 27.02.2016 e tirado daqui

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