18 maio 2016

Textos dos dias que correm

Milagre? Talvez. Mas antes de tudo, agradecimento

Uma menina de seis anos está em Lourdes com a mãe. Vive com aparelhos acústicos, é surda de nascença, depois de um grave parto prematuro. Brinca, depois corre para a mãe e tira os aparelhos. «Já não me servem, sinto-me bem», anuncia, alegre. A história, ocorrida a 11 de maio, é daquelas que deixam quem a ouviu entre a comoção e a cautela.

O episódio teve numerosas testemunhas, e um vento de júbilo e gratidão difundiu-se entre os peregrinos milaneses da União Nacional Italiana de Transportes de Doentes a Lourdes e Santuários Internacionais, a que a família da criança se tinha unido. A documentação médica será analisada pelo gabinete de medicina do santuário francês, que verificará o estado da criança, antes e agora. Quem testemunhou o acontecimento não fala, prudentemente, de milagre, que é evento inesperado e cientificamente inexplicável, mas de cura; e de curas, sobretudo espiritual, não ocorrem poucas em Lourdes, testemunham os sacerdotes que acompanham os peregrinos.

Enquanto se aguarda que o gabinete médico de Lourdes faça as suas inquirições, o que é tocante são as palavras da mãe da criança: «Uma manhã disse a mim própria: tenho de levar a minha filha a Lourdes. Para agradecer a Nossa Senhora que a protegeu: tinha a vida em risco, e hoje é uma menina serena e feliz. Mas também para pedir apoio, para encontrar a força para enfrentar, ela, eu, todos nós, este caminho de vida tão exigente». E assim a mulher decidiu ir a Lourdes antes de tudo para agradecer aquela filha, nascida com apenas seis meses de gestação no dia de Natal de 2009. Pesava 800 gramas. Os médicos conseguiram salvá-las, mas os medicamentos que se utilizam nesses casos têm efeitos secundários e podem conduzir à surdez.

E foi assim que aconteceu, a criança fala e brinca com os seus companheiros, mas foi-lhe diagnosticada uma surdez profunda. Uma deficiência grave, portanto. E todavia aquela mãe foi a Lourdes para dizer «obrigado». Talvez só quem teve um filho doente pode compreender profundamente como aquela que a outros é uma odisseia, para uma mãe pode ser já uma graça. Porque aquela filha, de quem se temeu que não vivesse, lentamente foi crescendo, um dia após outro, adquirindo força e peso. A afeição a um filho que se acreditou perdido e que nasce como uma segunda vez pode ser extraordinário. Antes de pedir uma cura, que talvez lhe parecesse petição demasiado grande, a mulher vai dizer «obrigada – obrigada por ma teres deixado». E pede ajuda para a ajudar a crescer. Não há, em qualquer palavra sua, vestígio de recriminação; pelo contrário, há o contentamento pelo que aconteceu.

A história de hoje lembra-me uma peregrinação a Lourdes, há alguns anos. No avião que tinha partido de Roma havia um padre ancião, que há quase trinta anos regressava a Lourdes. Perguntei-lhe sobre acontecimentos que tivesse visto, e o que pediam as pessoas à Virgem, e porque é que muitos voltavam, fiéis, ano após ano. «Repara, a maior parte daqueles que eu acompanhei» - respondeu - «foram e voltaram para agradecer. É este o segredo: a gratidão de quem, mesmo doente ou pobre, olha para a sua vida e reconhece nela o bem». O bem de um casamento que nas dificuldades da vida segue em frente, de uma doença que se suporta, de um filho ferido num acidente mas que continua vivo. Neste sentimento, dizia o padre de cabelos brancos, o coração alarga-se e alegra-se já por aquilo que a vida dá. E regressa-se a casa reconstituído, e como que abraçado.

Ou às vezes, neste húmus de felicidade alguma coisa dos males que afligem o peregrino alivia os seus nós, que se volta a pacificar. Há curas interiores que não podem ser chamadas milagres, mas que são uma bênção para quem as experimenta. Depois, um dia, em Lourdes, há uma criança surda que tira os aparelhos acústicos. Milagre, talvez, outros o dirão. Ao ler esta cura, fica-nos desde já o pensamento de uma mãe que foi, antes de tudo, dar graças pela sua filha, assim como lhe foi dada, e a consciência da grandeza desta simplicidade. Em quem, como numa terra fértil, a graça de Deus pode trabalhar. E, por fim, é preciso ter a humildade de permanecer em silêncio: gratos por aquilo que pode acontecer, diante da Virgem, sem que saibamos dar-lhe um nome.


Marina Corradi
In "Avvenire", 15.5.2016
Trad. / adapt.: Rui Jorge Martins
Publicado aqui em 16.05.2016

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