10 abril 2018

Duas Últimas

Aviso à navegação: este post não é para gente que queira coisas contentinhas pela manhã.

O Eça falava no som triste do oboé mas eu tenho para mim que som triste mesmo é o do violoncelo. Talvez não haja instrumento tão triste, mesmo quando (e não é este o caso) toca uma música agitada. Há no som do violoncelo uma nostalgia, uma gravidade e uma tristeza bela que são independentes, quase, daquilo que interpretam. 

O violoncelo não é, digo eu que nada sei, um instrumento de Primavera, menos ainda de Verão: é outonal, sobretudo: reflexivo, convidando à interioridade, ao dobrar-se sobre si mesmo para efeitos de protecção do que agride e que vem do exterior, que por vezes não é mais do que o interior que parece que vem de fora. 

Talvez este canto dos pássaros que aqui vos trago não seja o que os traz para cá, mas o que os leva para fora. É um movimento de partida, porque outonal, porque acompanhado pelos dias que encurtam e que convidam à memória - esse refúgio que todo o homem procura em tempos de intempérie.

E talvez este cinema paraíso seja todo ele feito de preto e branco, de lembranças, de beijos roubados e de fogos que tudo levaram, menos aquilo que nenhum fogo consome.  

Não é, repito, um post para gente contentinha. Para isso há estabelecimentos melhores.

JdB




3 comentários:

  1. Estimado JdB,
    Como nas miríades de manifestações do Humano, a Música é um grande mistério. Cada um terá as suas predileções.

    Discordo que Oboé e Violoncelo sejam produtores de sons, de músicas tristes.
    V.G., TCHAIKOVSKY em Lago dos Cisnes e BACH em Suite No.1 in G para Violoncelo.

    Concordo que com estes instrumentos será 'mais fácil' criar tristeza.

    cumprimenta,
    eo

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  2. Caro eo,

    Agradeço a sua visita de agora e todas as outras, que muito me honra enquanto edito e dono do estabelecimento.

    Não levará a mal que discorde de si: achar que o violoncelo não é um instrumento que produz sons tristes, porque pode tocar peças mais alegres (e tenho dúvidas quanto à alegria da suite nº 1...) é o mesmo que negar que o cavaquinho é um instrumento alegre, mesmo que toque toadas tristes.

    Volte sempre, mesmo que para discordar.

    JdB

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  3. Claro que a 'Suite No.1 in G' não é alegre. Mas é vivaz.
    Como escrevi — no estilo de Pilatus: Quod scripsi, scripsi — as discordâncias são naturais, normais. Benvindo!
    eo, grato

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