Sou pessoa muito dada a metáforas: uso-as em conversas ou em discussões, amiúde para desespero velado ou acintoso de quem me ouve. Houve filósofos contemporâneos que escreveram abundantemente sobre o tema, mas estou demasiado preguiçoso para ir ver quem, quando e o quê. Por outro lado, sei que as festas, no seu sentido mais restrito, já terminaram. Não obstante, é da missa da noite de Natal que vou falar.
Por motivos que não vêm ao caso, este ano não fui à Missa do Galo com as pessoas que me acompanham desde há muito, mas com alguém que, embora próximo, talvez nunca tenha ido a essa missa, ou tenha ido muito pouco. Talvez por isso, ou apenas porque sim, dei por mim a pensar noutras coisas, ou a fazer metáforas daquilo que, noutras circunstâncias, seria apenas acontecimentos vulgares.
Cheguei à Igreja da Boa Novas, no Estoril, por volta das 23.45h, mais tarde do que é meu costume. Talvez por isso tenha visto tanta gente a aproximar-se de vários ângulos. Sentado no meu banco, e enquanto não começava a missa, fui vendo pessoas a chegar e a sentar-se; talvez tenha mesmo voltado a cabeça para trás para ver quem estava fora do meu ângulo normal de visão. Durante a missa olhei para o coro, que anima aquela missa, as dominicais e da Páscoa, há 40 anos talvez.
Vi algo diferente? Não, não vi. As pessoas chegam, sentam-se, o coro canta. Ano após ano é isto. Só que, pela primeira vez, criei metáforas que só me encanta a mim, seguramente: se imaginarmos a Igreja da Boa Nova como o lugar geométrico de todas as igrejas do mundo, as pessoas que chegam de vários ângulos podem ser representativas das pessoas que se aproximam da Igreja Católica vinda de vários enquadramentos geográficos, sociais, económicos; gente que caminha na mesma direcção - naquele dia específico, da manjedoura onde estava o Menino Jesus.
Olhar para as pessoas que entram na Igreja não é um exercício de mexeriquice social, não é uma curiosidade banal. Ver as pessoas - ver aquelas pessoas - é tomar contacto com a comunidade, é cruzar-me com gente que vejo uma vez por ano, ou uma vez por semana, que faz parte da mesma paróquia do que eu, ou que eu cumprimento na rua porque os vejo nas celebrações pascais ou de Natal. Aquelas pessoas são a comunidade que, no mundo inteiro, se junta ao redor daquilo em que acredita.
Por último, ver o coro não é só ver o coro. A ideia de ver, nalguns casos, a terceira geração a cantar, não é apenas uma curiosidade familiar ou estatística. Dá-me uma noção de continuidade, de perenidade e renovação. Naquele coro já morreu gente, já nasceu gente, já saiu gente e já entrou gente. Muitos são membros da mesma família - da minha família, também. No seu conjunto, o coro não é mais do que uma fotografia da igreja de sempre: a continuidade no essencial, apesar de outras caras, outras vozes, outros timbres, outros estilos.
JdB
Gostei desta sua metáfora de olhar para pessoas diferentes que caminham na mesma direção, da ideia de comunidade e daquilo que nos une…
ResponderEliminarGostei de o ver acompanhado…
Beijinhos e Bom Ano!