23 abril 2019

Do impacto das primeiras viagens

Fotografia tirada da net

Sugerido por mão amiga, segui uma série na Netflix chamada Coisa mais linda. A história passa-se quase toda no Rio de Janeiro, no final da década de 50. Na verdade, o último episódio (desta aparente primeira temporada) passa-se no dia 31 de Dezembro de 1959 - o fim da década, portanto. O interesse da série? Objectivamente, boa música - a bossa nova -, actrizes bonitas, uma ou outra imagem da geografia natural do Rio de Janeiro, boa representação, possibilidade de conhecer o que era uma parte da sociedade carioca da época, uma história que se segue bem. Não conheci o Rio de Janeiro desse tempo. Fui lá pela primeira vez em 1975, talvez, mas esta série fez-me pensar no impacto das primeiras viagens.

Entre 1973 e 1976, conheci três cidades mundiais com algum significado: fui a Londres, ao Rio de Janeiro e a Madrid. Estas três viagens correspondem (para além da aventura de comprar borrachas com cheiro morango e caramelos Solano em Badajoz, mas não falamos do mesmo campeonato...) às minhas três primeiras idas ao estrangeiro. Fui a Londres com 15 anos, Rio com 17 e Madrid com 18. Não conhecia mais nada do mundo.

Sentado num sofá a ver Coisa mais linda, a apreciar algumas imagens (não muitas, nem particularmente fantásticas) das praias cariocas, percebi que o verdadeiro impacto da primeira viagem tinha sido o Rio de Janeiro e não Londres, menos ainda Madrid. Embora Londres fosse uma emoção -  o verdadeiro baptismo de voo, uma língua diferente, uma comida diferente, pessoas diferentes e uma cidade pujante e cosmopolita - o Rio de Janeiro foi ainda mais diferente, e eu não sei se consigo verbalizar com exactidão em que consiste a diferença. Estive em casa de portugueses amigos, dei-me com portugueses já amigos e outros de quem me tornei amigo, nunca saí de um perímetro geográfico relativamente pequeno. E, no entanto, algo houve. Penso muitas vezes: terá sido a praia? Copacabana ou o Leblon (para cuja praia íamos, parece-me) não é o Tamariz ou Cascais. Mas será que eu, com 17 anos, percebia uma diferença para além da óbvia: dimensão e temperatura?

Praia do Leblon, fotografia tirada da net

Dentro de mim há uma certeza que assenta numa sensação: num certo sentido, o Rio de Janeiro marcou-me como poucas cidades me marcaram ao longo dos muitos anos que levo de viagens. Em bom rigor, e repescando o parágrafo acima, talvez não tenha sido o Rio, mas a atmosfera do Rio. Talvez não tenha sido a praia, mas a atmosfera da praia. Arquitectonicamente o Rio é muito feio, sendo salva pelo enquadramento geográfico. Não obstante, houve um je ne sais quoi

Talvez o maior encanto da série Coisa mais linda seja esse: activar na minha memória uma sensação que não sei explicar, apesar de estar certo dela.

JdB

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