No discurso de início de ano proferido ao Corpo Diplomático acreditado junto da Santa Sé, o Papa apoiou-se num dos maiores génios da arte Ocidental para sustentar a mensagem de inauguração do Novo Ano. Convocou nada menos do que um dos Magníficos do triângulo de ouro do Renascimento italiano, a par de Leonardo e de Michelangelo.
No ano dos 500 anos da morte de Rafael (a 6 de Abril de 1520), o Papa invocou o exemplo do autor dos frescos que engrandecem várias salas dos Museus Vaticanos, lembrando o facto de a musa preferida do pintor ter sido uma mulher, a Mãe da Natividade. A presença de Maria prevalece nas telas de Raffaello Sanzio, quase todas célebres. Nos seus óleos ressalta a maternidade única e sagrada, sempre gentil e subtilmente debruçada sobre o Pequenino, que cuida com uma ternura tocante, sem excessos protecionistas nem aprisionantes, como se fosse fácil aquele velar atento e suave, em simultâneo, quase imperceptível...
Madonna no prado – Museu de História de Arte, em Viena |
Madonna Cowper (pequena), na National Gallery of Art em Washington |
Madonna com o Livro (Conestabile Madonna), Hermitage - S.Petersburgo. |
Madonna do Grão-Duque, no Palácio Pitti - Florença. |
Sagrada Família com palmeira, Museu de Edimburgo |
Francisco quis deter-se na tela dedicada à Assunção de Nossa Senhora, cujo dogma foi proclamado há 70 anos, para dirigir aos 180 diplomatas «um pensamento particular [sobre] todas as mulheres», 25 anos após a 4.ª conferência mundial da ONU sobre a mulher, realizada em Pequim, em 1995, «fazendo votos para que em todo o mundo seja cada vez mais reconhecido o papel precioso das mulheres na sociedade, e cesse toda a forma de injustiça, desigualdade e violência em relação a elas». Depois, advertiu contra a violência de que são alvo, em todas as latitudes, infelizmente, ferindo a humanidade no seu âmago: «Toda a violência infligida à mulher é uma profanação de Deus. Exercer violência contra uma mulher, ou explorá-la, não é um simples ato, é um crime que destrói a harmonia, a poesia e a beleza que Deus quis dar ao mundo».
Virgem da Assunção. |
Partindo da dupla virtuosa do exímio pintor renascentista e da sua musa de eleição, o Papa expôs aos 180 diplomatas a missão da Diplomacia e o alcance que pode ter: «A Assunção de Maria convida-nos também a olhar mais longe, para o cumprimento do nosso caminho terreno, para o dia em que a justiça e a paz serão plenamente restabelecidas. Sentimo-nos assim encorajados, através da diplomacia, que é a nossa tentativa humana, imperfeita, mas sempre preciosa, a trabalhar com zelo para antecipar os frutos deste desejo de paz, sabendo que a meta é possível». Explicou melhor as afinidades do esforço diplomático com o aperfeiçoamento que a Arte promove: «como o génio do artista sabe compor harmoniosamente materiais em bruto, cores e sons diferentes, tornando-os parte de uma única obra de arte, assim a diplomacia é chamada a harmonizar as particularidades dos vários povos e estados para edificar um mundo de justiça e de paz, é que é o belo quadro que desejamos poder admirar».
Apontando para a coragem de Rafael, que soube sublimar por via artística as dificuldades de tempos atribulados e com muito menos recursos para a maioria, o Papa assinalou: «foi um filho importante de uma época, a do Renascimento, que enriqueceu toda a humanidade. Uma época não privada de dificuldades, mas animada de confiança e esperança».
No final, associou Rafael aos desejos formulados para o Novo Ano: «Através deste insigne artista, desejo fazer chegar os meus mais sentidos votos ao povo italiano, a quem desejo que redescubra esse espírito de abertura ao futuro que marcou o Renascimento, e que tornou esta península tão bela e rica de arte, história e cultura».
Maria Zarco
(a preparar o próximo gin tónico, para daqui a 2 semanas)
Muito bem MZ.
ResponderEliminarO texto, sóbrio. A iconografia, rica.
Cumprimenta,
ao