29 setembro 2022

Crónicas de um participante de congresso internacional (I)

 Tomar refeições com pessoas de Espanha, Malásia, Austrália, África do Sul, Zimbabwe, India, Chile e Nova Zelândia tem uma valência sociológica. O neo zelandês não usa faca e descansa o antebraço inútil apoiando-o na mesa; o malaio viaja em permanência com um frasco de chili que adiciona a tudo o que anteceda a sobremesa. Pediu um bacalhau frito e despejou-lhe o picante por cima. Perante a opinião de que estragava a comida porque lhe introduzia um condimento dominante perguntou: porquê? A pergunta feita por quem condimenta uma omeleta ou um bacalhau à Gomes de Sá não suscita resposta. Apesar de estarmos em Espanha, o sul-africano achou que deve pedir um hambúrguer. A indiana não bebe álcool e emborcou 3 copos de vinho. Saiu a rir, corada de vergonha e de braço dado. Acontece-lhe isto sempre que a vejo, duas vezes por ano.

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 Assisto a uma sessão sobre a Ucrânia. Como já aqui falei uma vez, a comunidade ligada à oncologia pediátrica evacuou centenas de crianças e famílias para países da Europa (Portugal incluído). À pergunta de quais os desafios para o futuro, um pediatra oncologista afirmou sossegadamente: a manutenção da profissão. Na verdade, o que faz um oncologista pediátrico num país de onde foi retirada uma quantidade muito significativa de crianças com cancro. Tratam de quem, a curto prazo?

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Pela primeira vez desde 2019 (em Lyon) os congressos passaram a ser presenciais. Não preciso de descrever a alegria das pessoas, e da dificuldade que por vezes todos temos de identificar alguém que vemos todos os meses em formato tipo passe. Pessoas até com quem mantemos conversas por vezes de teor pessoal. E voltaram a dizer-me: no zoom pareces mais baixo... Curioso é também o facto de um cumprimento assumido por muitos participantes femininos: um abraço sem beijo. Os homens mantêm o aperto de mão, muitas mulheres abraçam com gosto. Free hugs, no fundo.

JdB  

2 comentários:

  1. Ainda bem! Umas notas do que é a vida humana.

    Abraço

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  2. Já levo alguns anos destas conferências internacionais. E, salvo reduzidas excepções, nunca me cruzei com (quase) ninguém desagradável, arrogante, a dar-se ares de superiores. Não sei se é sorte, se é mesmo assim. E tem sido um orgulho ver o gosto com que os médicos acolhem (e promovem) a voz dos pais nas suas decisões.

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