08 novembro 2023

Vai um gin do Peter’s ? 

 HAVERÁ ARMAS DE PAZ PARA CALAR OS CANHÕES?...

Em 2016, o realizador de cinema, argumentista e empresário artístico israelita Or Taicher concebeu um projeto coral ecuménico, apostado no poder da música para congregar vozes desavindas. Assim deu corpo ao grupo Koolulam, onde cantam judeus, muçulmanos, cristãos e gentes de outros credos e etnias. Depois de reunir um público maximamente diverso, Taicher propõem-lhes um tempo de ensaio para conseguirem depois cantar em conjunto. A ária mais interpretada tem sido «ONE DAY», quer pela simplicidade rítmica, quer pela força ecuménica da letra, que tem ressonâncias óbvias com o célebre discurso de Luther King «I have a dream that one day…». Uma das interpretações famosas decorreu na terceira maior metrópole israelita, onde 10% da população é árabe – Haifa. Era o célebre dia de S.Valentim, naquele 14 de Fevereiro de 2018, que juntou três mil desconhecidos, que se dispuseram a uma hora de ensaio para chegarem a este resultado musical e multilinguístico, que ressoa como uma oração ecuménica:   


«ONE DAY

One day, one day, one day

Sometimes I lay under the moon
And thank God I'm breathin'
Then I pray, "Don't take me soon
'Cause I am here for a reason"

Sometimes in my tears I drown
But I never let it get me down
So when negativity surrounds
I know someday, it'll all turn around because

All my life, I've been waitin' for
I've been prayin' for, for the people to say
That we don't wanna fight no more
There'll be no more wars, and our children will play

One day (one day), one day (one day)
One day (oh-oh-oh)
One day (one day), one day (one day)
One day (oh-oh-oh)

It's not about win or lose
'Cause we all lose when they feed on the souls of the innocent
Blood-drenched pavement
Keep on movin' though the waters stay ragin'

In this maze, you can lose your way, your way
It might drive you crazy
But don't let it faze you, no way, no way

Sometimes in my tears I drown (I drown)
But I never let it get me down (get me down)
So when negativity surrounds (surrounds)
I know someday, it'll all turn around because

All my life, I've been waitin' for (waitin' for)
I've been prayin' for (prayin' for), for the people to say
That we don't wanna fight no more (fight no more)
There'll be no more wars (no more wars), and our children will play

One day (one day), one day (one day)
One day (oh, oh, oh, oh-oh-oh, one day)
One day (one day), one day (one day)
One day (oh-oh-oh)
One day, this all will change, treat people the same

Stop with the violence, down with the hate
One day, we'll all be free and proud to be
Under the same sun, singin' songs of freedom like

Wah-yo (one day, one day), wah-yo, oh, oh (oh-oh-oh)
Wah-yo (one day, one day), wah-yo, oh, oh (oh-oh-oh)

All my life, I've been waitin' for
I've been prayin' for, for the people to say
That we don't wanna fight no more
There'll be no more wars, and our children will play

One day (one day), one day (one day)
One day (oh-oh-oh)
One day (one day), one day (one day)
One day (oh-oh-oh)
One day, one day, one day»

Autores: Bruno Mars / Ari Levine / Matthew Miller / 
/ Philip Martin Ii Lawrence

Também na música clássica, algumas vozes de paz se têm erguido, sobressaindo o grande maestro judeu Daniel Barenboim, que criou a West-Eastern Divan Orchestra com o seu amigo palestiniano – o crítico literário e activista político Edward Said (1935-2003). Corria o ano de 1999 e a intenção era constituir um corpo orquestral formado por judeus e árabes. A estreia musical teve lugar em 2009, pelo que Said não pôde assistir ao concerto regido por Barenboim, no Cairo. Em duas décadas, a Divan Orchestra tem vindo a somar sucessos, já sendo considerada das melhores orquestras do mundo. Todos os Verões, com excepção dos dois anos de pandemia, os músicos reúnem-se com o maestro para treinarem e preparar as actuações da temporada seguinte: 


Reflectindo com o músico talentoso e de grande estatura humana que é Daniel Barenboim, percebemos quanto a música tem uma capacidade regeneradora incalculável, embora sem se substituir ao papel dos políticos-diplomatas e até dos generais que intervêm em legítima defesa. Segundo o maestro, uma das lições da música provém da sua condição natural assente no contraponto, na constante necessidade de diálogo harmonioso, que não esbate as individualidades, antes a orquestra para se atingir um conjunto polifónico rico, porque transbordante de pluralismo. Era o segredo aplicado ao continente europeu pelo magno mestre da História, o Prof. Jorges Borges de Macedo, considerando que o ponto de equilíbrio da Europa dependia de ser reconhecida como o espaço da diversidade entre nações complementares. A sua força residia, afinal, no seu ponto mais frágil e desafiante. 

Para Barenboim, a música é também uma escola de democracia, pois cada instrumento actua a seu tempo, fazendo depois fluir o protagonismo para os outros, cada um à vez. O resultado vai sendo construído em equipa, sendo importante aprender e acompanhar as várias etapas musicais, ora em crescendo até ao allegro vivace, ora em pianíssimo, só possível se houver uma cooperação rigorosa e permanente entre os músicos. Todos, todos, todos! É também muito evidente a indispensabilidade de cada elemento no conjunto.  Nesse sentido, o maestro considera que a música oferece um testemunho de coabitação benigna, inspiradora e aplicável a todas as dimensões da vida em sociedade. Queiram as pessoas!...   

Com enorme lucidez, o maestro não se arvora em político e enjeita qualquer politização da Divan Orchestra, ciente de que a música não tem capacidade para «dar justiça aos palestinianos e segurança aos israelitas» (sic). Nem sequer tem essa função, à parte de demonstrar a possibilidade de pessoas de países inimigos conseguirem trabalhar no mesmo projecto, ajudando-se e complementando-se mutuamente, pois da boa harmonia entre todos depende o sucesso da polifonia final. 

O judeu nascido na Argentina fala com a autoridade da sua inquestionável qualidade musical, ele que aos 7 anos impressionou o mundo como menino prodígio do piano e aos 14 já regia a Royal Philharmonic Orchestra de Londres! É também eloquente a ligação de Barenboim a Beethoven, reconhecendo a mensagem de humanidade que impregna a música do compositor de oitocentos, além da honestidade e a coragem que consideram transbordarem da sonoridade riquíssima do alemão. 

Quando se calará o zumbido mortífero das bombas? Quando e o que conseguirá pôr cobro ao ódio assassino e insaciável, que continua a desestabilizar o Médio Oriente?   

Maria Zarco
(a preparar o próximo gin tónico, para daqui a 2 semanas)

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