08 outubro 2025

Vai um gin do Peter’s ?

TRUQUE DOS MÉDICOS DE ROMA PARA ENGANAR OS NAZIS 

Recuando à agitada primeira metade do século XX, com países a despontar e outros a desaparecer, duas guerras mundiais tremendas e uma nova ordem internacional a surgir das cinzas da Segunda Guerra, Itália esteve no epicentro da turbulência política da época. Açoitada por extremismos de direita e de esquerda violentos e despóticos, acabou por sucumbir à sedução de Mussolini, na miragem de novas oportunidades para os descamisados. 

O Duce nas grandes manifestações populares. Anos mais tarde, com o seu maior aliado.

Rapidamente se percebeu que os sonhos ficavam muito aquém da realidade, pois a economia não arrancou suficientemente, pelo que o Governo passou a recorrer à repressão para se manter no poder, replicando a receita de todos déspotas. Mais do mesmo, não fora outra potência europeia especialmente eficaz e com sonhos imperialistas ter surgido no horizonte, fazendo tremer todo o continente: uma Alemanha nazi reindustrializada, fortemente militarizada e a sentir-se apertada, além de injustiçada, nas fronteiras mais reduzidas impostas pelo Tratado de Versailles (perdera cerca de 13% do território) após a derrota na Guerra de 1914-18.     

Para azar de muitos italianos, o deflagrar da Segunda Guerra conseguiu piorar a situação do país, com a decisão do Duce de alinhar com Hitler, integrando as sinistras Forças do Eixo e entrando em conflito com os Aliados.  Quando as forças anglo-americanas começaram a libertar a península itálica do jugo do Eixo e derrubaram Mussolini, as tropas nazis ocuparam o Norte do país e Roma para estancar o avanço dos aos adversários. Terá sido o Outono mais sombrio da capital italiana, até à libertação aliada, em Junho de 1944. 

A 16 de Outubro, as SS lançaram-se numa feroz perseguição aos judeus da capital, que se refugiaram em conventos e em hospitais, para evitarem ser embarcados à força em comboios de onde ninguém voltava. Um dos refúgios mais procurado foi o hospital Fatebenefratelli, que estava estrategicamente situado junto ao gueto judaico da Ilha Tiberina, em Roma.  

Gueto judeu da capital italiana.

O magnífico hospital junto ao gueto judeu de Roma.

Com criatividade e enorme coragem, a equipa médica de Fatebenefratelli fez jus ao nome do hospital – Fazei-bem-Irmãos – e forjou um plano para salvar refugiados judeus das garras das SS. Começaram a diagnosticar os fugitivos com «il morbo di K»! A designação do novo síndrome surtiu bom efeito nos alemães, que associaram o “K” à doença de Koch (tuberculose) e ficaram aterrorizados com a perspectiva de uma pandemia em plena guerra. O nome de código da doença fictícia serviu na perfeição para encaminhar os diagnosticados para os circuitos de fuga até locais menos expostos. Para os autores da recém-inventada síndrome, como o professor Giovanni Borromeo, o médico Vittorio Sacerdoti e outros, o “K” era uma alusão aos dirigentes nazis em Itália: Herbert Kappler - chefe da polícia na Roma ocupada, responsável pela campanha de detenção judaica e Albert Kesselring - marechal de campo incumbido de rechaçar os Aliados de Itália. Os dois foram, depois, condenados por crimes de guerra. 

Em tempos difíceis, ensombrados por tensões perigosas, como os actuais, lembrar truques eficazes para salvar inocentes, sem aumentar o clima de pressão, é uma arte! Que bem inventada a maravilhosa doença K, cuja criatividade tão eficaz deveria servir de inspiração aos diplomatas e aos governantes para salvar os inocentes de hoje.   

Maria Zarco
(a preparar o próximo gin tónico, para daqui a 2 semanas)

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