17 julho 2008

A vida triste dos palhaços...


Há muito, muito tempo, era eu uma criança (lembram-se desta música?) detestava mascarar-me. Suportava um traje de cóbói (é assim, com o novo acordo?) e pouco mais. Daria, seguramente, a visão de uma criança triste e desenquadrada dos pierrots, dos arlequins, dos polícias, das sevilhanas ou dos astronautas. Se pusesse uma máscara (à força, obviamente) era o retrato vivo do menino que chora, de cujo olho brota uma lágrima com a dimensão de um berlinde.
Vem isto a propósito do que são as máscaras que pomos hoje em dia, no carnaval que vivemos durante grande parte do tempo. Artefactos que usamos com orgulho, desespero, felicidade, vontade imensa de pertencer a um grupo com o qual nos queremos integrar. Nem sempre somos o que somos, mas aquilo que achamos que os outros esperam de nós, ou que dá de nós próprios uma imagem de sucesso. Talvez esquecendo que é a genuidade (não existe a palavra, pois não?), tantas e tantas vezes, que provoca um encanto duradouro no outro.
Ontem jantei com um amigo com quem mantenho uma amizade relativamente recente, mas muito partilhada. Difere de mim em muitas coisas - na forma como quer gerir a sua auspiciosa carreira profissional, no gosto por alguns livros ou discos, na visão que tem sobre a influência do Império Britânico. Ligam-me a ele duas coisas fundamentais (entre outras igualmente importantes): a incondicionalidade da amizade e a desinibição da conversa. Quando falamos, não pomos a máscara de homens que falam de carros, de motos, de mulheres ou de bola. Quando falamos, falamos do que nos move, do que nos emociona (do amor saudavelmente obsessivo que ele nutre pela mulher) ou do que nos diminui.
Não invejo (ainda que respeite) a vida triste dos palhaços - metaforicamente falando. Ninguém conhece quem são os manéis carlos ou os rubens cristianos desta vida - sabemos, isso sim, quem é o palhaço rico e o palhaço pobre, soprarem um trompete ou a sacar arpejos de uma lâmina de serra.
Somos o que somos - e quando queremos ser diferentes, quando queremos ser algo ou alguém só para, supostamente, agradar a este, àquele, ou à sociedade, pomos um engano no rosto que esconde a nossa verdadeira natureza. É a vida triste de um palhaço.

Adeus, até ao meu regresso.



8 comentários:

  1. Pois é; deve ser por isso que há tantas crianças a ter medo dos palhaços...

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  2. Gosto dos palhaços pobres, mesmo sem lhes achar grande graça. Fazem-me ternura, talvez. Já os palhaços ricos sempre me despertaram instintos assassinos, vá-se lá saber porquê...

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  3. São aterradores estes palhaços!
    Deus lhe conserve a “genuidade” e o livre destas palhaçadas. O seu talento e graça são outros… são a razão da minha esperança neste “Adeus até ao meu regresso”.
    Escolheu o continente certo para discernir – lá as máscaras têm o condão de revelar.
    Fico à espera de impressões, de estados de alma, de sons e sabores africanos. Os cheiros dispenso mas são os que mais se colam à pele e marcam esse ambiente.
    Beijinhos duma africana convicta e feliz por ver nascer este blog!
    Parabéns ao “bloyeur”!

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  4. Arit Netoj... Curioso, um nome tão invulgar. Obrigado pela sua visita, espero que goste o suficiente para se tonar assídua.

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  5. Virgem ....em relação aos blogs. Estou desconfiada, receosa,verde como qq virgem.
    Detesto palhaços pelo barulho que fazem sem me avisar. Gosto de estar preparada.Mas gosto do Carnaval de me mascarar seja em q altura do ano for. Esquisito, não é? O ser humano é estranho.

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  6. João: Obrigado pela visita, que espero que se repita. Nunca gostei de palhaços, sobretudo dos que querem parecer o que não são.

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  7. Já gostei de palhaços, no passado. E de máscaras também. Mas um dia o circo pegou fogo, as máscaras caíram... e que decepção! A partir daí considero a autenticidade um bem escasso, muito escasso mesmo. Aprendi a valorizá-la. Gosto de imperfeições. São tão mais atraentes! Ah! João, esse seu amigo, sim, aquele que adora a mulher. Mande-lhe cmprimentos. Sorte a dela!

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  8. Obrigado pela visita, ETM. E já reencaminhei a sua mensagem ao meu amigo - que espero partilhe com a mulher. Apareça sempre, mesmo que não haja palhaços.

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