26 abril 2009

3º Domingo da Páscoa

Hoje é Domingo, e eu não esqueço a minha condição de Católico.

A minha vida não será muito diferente da existência da maioria das pessoas: momentos bons, em que tudo parece correr sobre rodas fruto de um alinhamento favorável dos astros, da sorte, do nosso esforço; outros haverá em que me vem à memória uma frase dita por um amigo de longa data à mesa das cartas: quando a sorte é maniversa, nada vale ao desinfeliz: em cima de uma vida profissional periclitante surge um pneu furado numa estrada secundária às escuras, depois de detectada uma dor de dentes descontrolada a horas impróprias de dentista.

Algumas pessoas com quem vou conversando solidarizam-se com os meus momentos menos bons, assim como se regozijam com os que me alegram. Para os primeiros têm palavras de estímulo, de conforto, de ânimo. Não raras vezes surgem frases retiradas da alma, da sabedoria popular, dos livros de auto-ajuda: vais ver que Deus te ajudará, ou, ainda, um dia descobrirás o sentido para isto que acontece; já devo ter ouvido que não há acasos, tudo tem uma razão.

Confesso com humildade e convicção em partes iguais: tenho a certeza de que Deus não tem nada a ver com o interruptor que é a minha (nossa) vida, no sentido de não ser Ele quem o activa. Se assim fosse, qual a justiça de ver gente de um lado a quem tudo parece correr bem e, do outro, gente a quem a vida parece um permanente carreiro de silvas? De facto, o que nos acontece faz parte das leis terrenas, do acaso, da nossa atitude, também, perante alguns acontecimentos que ensombram ou iluminam os nossos passos.

Quanto ao sentido que damos aos acontecimentos, tudo fia mais fino… Há muito que me habituei a não perguntar porquê?, mas para quê?. Há uma sensação de déja vu, tantas as repetições do raciocínio. Confesso, no entanto, que nem sempre consegui obter respostas. Nalguns casos, mesmo, a minha mente tem dificuldade em formular a pergunta. Quedo-me pelos sentimentos mais negativos e que não acrescentam qualquer valor à resolução dos vários problemas com que me defronto. Quando me indicam criaturas de Deus que fizeram isto ou aquilo, que reagiram com sucesso desta ou daquela maneira, respondo silenciosamente com o encanto na diversidade da vida: nem todos resolvem todos os problemas da mesma forma, e alguns só conseguem mesmo resolver parte.

E, de facto, pergunto: será que tem de haver um sentido para aquilo que nos acontece, ou, independentemente de sabermos as causas de determinadas ocorrências, a nós não nos resta mais do que apanharmos os despojos em que nos tornámos e talharmos um fato novo à medida do que sobra ou se reconstruiu? Haverá, na realidade, um motivo para tudo o que nos sucede, ou desse mesmo tudo apenas podemos e devemos tirar um ensinamento? Será que determinados eventos na nossa caminhada fazem parte de um esquema global e misterioso, cujo sentido nem sempre temos tino para descortinar? Essa coisa de um dia mais tarde perceberás porque te aconteceu isto baralha-me o raciocínio, confunde-me, leva-me ao determinismo e ao livre arbítrio. Não te metas nisto - seria conselho amigo de um professor de Ciências Naturais às dúvidas legítimas de alunos curiosos...

Muito se fala, a propósito do que referi acima, de felicidade, do que isso é, do que queremos e de como lá chegamos. Textos há que nos surpreendem, não pelo raciocínio brilhante, mas pela oportunidade do seu surgimento. Será uma prova da tal ordenação de factos e acontecimentos à escala planetária e oculta? Texto do Pe. Vasco P Magalhães, retirado daqui:

Uma mentira, por mais que se proclame e repita, não passa a ser verdade. Uma das mais frequentes e destruidoras é esta: Tenho direito a ser feliz! E esta mentira instala-se na cabeça de imensa gente a ponto de justificar tanto abandono e sofrimento, tanto acto egoísta. Tudo por um prazer, quase sempre efémero, tornado direito. Com isto avança um mundo doente e em ruptura. Ser feliz não é direito, mas dever! Tenho o dever de procurar a felicidade e só me aproximarei dela fazendo felizes os outros! Mas, atenção, felicidade não é ausência de sofrimento.

JdB

6 comentários:

  1. "... gente dum lado a quem parece tudo correr bem ...." .... parece, JdB, é, precisamente, a questão. Fruto do nosso temperamento, da nossa sorte, dos nossos encontros e desencontros - e aí concordo consigo que Deus não tem muito a ver com isso - mas a sorte maniversa calha a todos. A uns duma forma, a outros doutra. Não há vida sem sofrimento. Ás vezes é aos 10 anos, aos 20, outras vezes aos 30, 40, 50, depende ... mas a questão do PARECER é da maior importância. Não sabemos o que se passa portas adentro e muito menos o que vai na alma de cada um. pcp

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  2. Tal como já sabe, acredito num Deus que por amor nos tornou livres, por isso, não determina nem engendra esquemas para as suas criaturas. Actua duma forma muito subtil porque se propõe, não se impõe. Inspira-nos, apoia-nos, ilumina-nos, ajuda-nos a encontrar o sentido com Ele, a superar-nos, a conseguirmos ir mais longe na nossa condição humana. Por isso, tantas vezes, nos sentimos felizes no meio de tanto sofrimento - é nessas alturas que sinto especialmente a presença de Deus.
    Acredito nalguns acasos, tal como este de encontrar e citar o Pe. Vasco Pinto Magalhães com um recado tão certeiro.
    Beijinhos.

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  3. PCP: obrigado pelo seu comentário. "Isto" de alimentar um blogue tem destas coisas: vamos pensando no que queremos escrever e, na hora da verdade, o tempo, o esquecimento, a desinspiração tira-nos as ideias. Queria ter mencionado o PARECER de que falou e que é tão importante. Às vezes ficamo-nos pela rama e não vemos além do desfocado, não entramos verdadeiramente na vida das pessoas. Porque é aí que, tantas vezes, se vêem infelicidades escondidas.

    Arit Netoj: Obrigado pela visita. De facto, estes temas não são novidades nas nossas conversas, no que fomos escrevendo enquanto Deus nos pregava partidas. E na realidade, nessa altura como agora, batem-me na testa escritos que me parecem ser dirigidos, tão a propósito vêm com as coisas da minha vida. Será uma espécie de maldição? (isto sou eu a brincar, porque não acredito nelas, mas que as há, há...)

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  4. JdB, uma pulga nunca vai conseguir perceber que todo o seu universo se resume, afinal, a um pequeno cão. Se fôr um caniche da Madona, a pulga tem sorte; se fõr um vira-latas de um sem-abrigo a pulga tem azar. E nós ? Não acha que, tal como a pulga, somos parte de algo muito mais grandioso que nos excede, nos transcende, nos extravasa ? Se não nos são dadas a conhecer todas as premissas... como poderemos nós resolver a equação ? :-) Bj

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  5. MAF: quase diria o contrário... Uma pulga tem mais hipóteses num vira-latas do que no caniche da Madona. A sobrevivência, sabe...
    Há algo de mais grandioso que nos transcende, não tenho dúvidas. A questão, para mim, é mais simples (ou mais complexa?): fazemos parte de um esquema definido e montado, como se fossemos actores de uma peça que já foi escrita, ou vamos compondo os actos à medida que calcorreamos o palco? Ou será uma mistura de ambas? Bj.

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  6. Para mim, sem dúvida, uma mistura de ambas. O enredo e o elenco já lá estão; a performance é o nosso livre arbítrio ... mas quem sou eu para afirmar ? :-)

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