As melhores viagens são, por vezes, aquelas em que partimos ontem e regressamos muitos anos antes
09 abril 2025
Vai um gin do Peter’s ?
TRUQUE PARA OS CLIENTES LARGAREM OS TELEMÓVEIS
Todos iguais, todos diferentes, dizia George Orwell! Assim também cada país, cada artista ou empresário ou pai desencanta uma solução própria para combater o vício desumanizante do excesso de telemóvel, que já será a arma antissocial mais disseminada (porque acessível) do mundo! Em Itália, um restaurante privilegiou uma abordagem deliciosamente positiva. Mas comecemos pelo cinema, onde pululam denúncias mais incisivas.
Curiosamente, provém da Ásia uma onda de alertas, em versão animada – ora de pendor emotivo, ora mais satírico-corrosivo –, sobre o isolamento que o telemóvel pode provocar, naturalmente quando há excesso. O problema é a facilidade com que maus hábitos insignificantes resvalam, rapidamente, para o vício patológico.
Percebe-se que a febre dos telemóveis esteja exacerbada em países com produção própria ou com populações adolescentes especialmente tecnológicas. Isso explicará por que se tornou num tema recorrente em curta-metragens animadas do Indo-Pacífico, merecidamente premiadas pela indústria cinematográfica.
O filme «Addiction» do malaio Ngu Yon Xian baseia o argumento numa experiência imprevista e dolorosa na vida de uma adolescente de 12 anos, a quem o pai ofereceu o presente da sua vida – um portentoso telemóvel. Mal sabia ela a armadilha que lhe caíra nas suas mãos imaturas e impreparadas para aquela proeza high-tech:
O indiano Ashok Patel adopta um script semelhante na sua curta-metragem 3D «O ECRû (de 2023), também dramático e irónico, também protagonizado por um teenager irresponsavelmente viciado no telemóvel, com consequências trágicas para todos. A mensagem aos adolescentes surge em grandes parangonas, no final, se dúvidas houvesse: «Mobiles are made for humans, but humans are not made only for mobiles. STOP MOBILE ADDICTION»:
A perspectiva do jovem chinês Chenglin Xie é mais satírica e mordaz, sem discriminações etárias. Os adultos até são os mais visados na curta-metragem animada «LIFE SMARTPHONE» (de 2015). Será possível correr bem um dia-a-dia debruçado sobre o pequeno ecrã, alheado de tudo o que acontece em redor? A sucessão de gaffes e de desastres causados pela selfie mania, entre outros tiques tecnológicos, é acintosamente interpelativa:
Claro que estes pequenos ‘rectângulos’ são neutros do ponto de vista ético. Não faria sentido imputar-lhes qualquer responsabilidade – menos ainda culpa – pelos nossos comportamentos, quando desvirtuamos a sua utilização. A atracção incontornável dos pequenos computadores-telemóveis tornam-se um perigo, sempre que nos afastam dos outros, da realidade, preferindo ver o mundo pela lente da pequena máquina que julgamos controlar. Quanta ilusão… Porém, nunca é a faca que mata, mas o coração do homem, como lembrava o Papa João Paulo II. Claro que cabe a cada um decidir o tipo de utilização e o tempo a despender com estes equipamentos tão úteis. Bem sabemos como os excessos tendem a virar-se contra nós (com efeito direto no consumo desregrado de recursos básicos como comida & bebida, por exemplo e por azar).
Em Verona, um restaurante optou por incentivo positivo para os clientes largarem os telemóveis e gozarem a companhia dos companheiros de mesa. O truque tem-se revelado um sucesso, quer por melhorar o convívio, quer também por reduzir o barulho infernal das chamadas e das muitas pessoas que berram recados para o outro lado da linha. 90% dos clientes tem alinhado no convite do Al Condominio, para deixarem o tm num cacife, à entrada, e assim ganharem direito a uma garrafa de vinho Maia (Pinot noire)! Há-de ser bom, atendendo à taxa de adesão à deliciosa proposta facultativa. Segundo explicava o dono, Angelo Lella, ao diário britânico The Guardian sobre os paradoxos do telemóvel, bem mais associal do que parece: «We live with our cell phones always in our hands, and this is making us unaccustomed to socialization and communication. We wanted to open a restaurant that was different from the others. So we picked this format – customers can choose to renounce technology while enjoying a convivial moment together. Technology is becoming a problem – there is no need to look at your phone every five seconds, but for many people it is like a drug … This way they have an opportunity to put it aside and drink some good wine.»
Testemunho de Angelo Lella: «It really is a beautiful thing to see people embracing it – they are talking to each other rather than looking at photos or responding to messages on their phone.»
Na mesma senda do humor, uma tasca alentejana, cujo letreiro percorrei mundo pelo WhatsApp, deixa um aviso divertido:
Páscoa é tempo de desacelerar, aliviar a agitação diária, recuperar paz interior, condiz com estes alertas de maior atenção aos outros, melhor foco sobre a realidade, mais abertura ao que nos rodeia. O convite a um silêncio reflexivo, que aguce o olhar e o ouvido, precisa sempre de desintoxicação, a começar por um saudável jejum dos múltiplos ecrãs que nos rodeiam. Serão os mínimos olímpicos para ganharmos disponibilidade – de agenda e de atitude – para o essencial. Boa Semana Santa e Feliz Páscoa a todos!
Maria Zarco
(a preparar o próximo gin tónico, para daqui a 2 semanas)
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