Hoje, mas há uma semana, rezava-se missa no Santuário da Boa Nova, no Estoril, com a presença do Cardeal Patriarca. Durante as duas horas que durou a cerimónia pensamos em tudo. Em mim germinou a carta que escrevi ao prior, e de que partilho a maior parte.
Sentei-me Domingo, eram 10.40h, na Igreja da Senhora da Boa Nova. Ocupei, com o meu filho Segismundo, dois lugares anónimos no meio de muita gente. Neste dia especial não tinha nenhuma responsabilidade a não ser rezar pelos outros, pela nossa Igreja, pela força e discernimento que não nos devem abandonar nunca. Ali, frente a uma parede branca e nua, onde Nossa Senhora velava por nós, dei por mim a pensar. Olhei para Cristo crucificado e confirmei uma ideia importante: onde outros vêem uma morte dolorosa, alguns vislumbram um amor limite. E dei por mim a pensar. E à medida que olhava para os lados, para a frente e para trás, e que via uma multidão de gente com a qual nunca me teria cruzado, dava por mim a pensar que, de facto, há coisas que são maiores do que nós. Durante duas horas fui um fiel desconhecido no meio de fiéis desconhecidos. Durante duas horas ninguém me reconheceu como o homem que lê, que acolita, que ajuda a distribuir a comunhão. É uma perspectiva diferente, mas é uma perspectiva importante.
Ao olhar para o altar, reconheci dois dos três priores de Santo António do Estoril que tive o gosto de conhecer. Ambos, à sua maneira, reforçaram a minha fé e ajudaram-me a repetir em voz alta, mesmo que fosse para o meu interior, palavras-chave na nossa deambulação pela Terra: tolerância, serviço, dedicação, altruísmo, próximo, fidelidade. Serei um mau aluno, seguramente, e é por isso que continuo a repetir as palavras… Talvez um dia venha a conhecer um quarto prior, e um quinto, frutos do dinamismo próprio da Igreja. Olharei para todos com a certeza de que acrescentaram valor a algo que nasceu antes de nós e morrerá muito depois. Tão depois que não conseguimos vislumbrar.
Ao olhar para o altar, reconheci dois dos três priores de Santo António do Estoril que tive o gosto de conhecer. Ambos, à sua maneira, reforçaram a minha fé e ajudaram-me a repetir em voz alta, mesmo que fosse para o meu interior, palavras-chave na nossa deambulação pela Terra: tolerância, serviço, dedicação, altruísmo, próximo, fidelidade. Serei um mau aluno, seguramente, e é por isso que continuo a repetir as palavras… Talvez um dia venha a conhecer um quarto prior, e um quinto, frutos do dinamismo próprio da Igreja. Olharei para todos com a certeza de que acrescentaram valor a algo que nasceu antes de nós e morrerá muito depois. Tão depois que não conseguimos vislumbrar.
Do anonimato daquele meu lugar comecei por mim, olhei em volta, e vi o protagonismo, a necessidade de evidência, o desejo de poder, a pedra que estamos prontos a atirar ao outro. Mas, do anonimato daquele lugar, vi também a entrega a uma causa, a vontade de deixar obra, o anseio de um caminho de melhoria. No fundo, do anonimato daquele meu lugar olhei em volta e vi a igreja, com todas as suas fraquezas, mas com todas as suas vocações de santidade. E senti-me bem porque, de facto, encerro em mim, também, o melhor e o pior. E é esta Igreja, imperfeita e humana, que me tem ajudado. E é a esta Igreja, incompleta e esforçada, que eu agradeço aquilo que sei agradecer, mais o resto, tanto, que nem eu sei exprimir.
Hoje é Domingo, e eu não esqueço a minha condição de Católico. Talvez o início do Evangelho de hoje (de que copio dois excertos) fosse a minha leitura preferida e esperançada há oito anos. Agora, olho para trás e vejo que há outros milagres, porque não tive a sorte de Jairo, um dos chefes da sinagoga. Há o espanto e acontecimentos relevantes a marcarem a minha caminhada de lá para cá.
Naquele tempo,
depois de Jesus ter atravessado de barco
para a outra margem do lago,
reuniu-se grande multidão à sua volta,
e Ele deteve-Se à beira-mar.
Chegou então um dos chefes da sinagoga, chamado Jairo.
Ao ver Jesus, caiu a seus pés
e suplicou-Lhe com insistência:
«A minha filha está a morrer.
Vem impor-lhe as mãos,
para que se salve e viva».
(...)
***
(...)
Quando chegaram a casa do chefe da sinagoga,
Jesus encontrou grande alvoroço,
com gente que chorava e gritava.
Ao entrar, perguntou-lhes:
«Porquê todo este alarido e tantas lamentações?
A menina não morreu; está a dormir».
Jesus encontrou grande alvoroço,
com gente que chorava e gritava.
Ao entrar, perguntou-lhes:
«Porquê todo este alarido e tantas lamentações?
A menina não morreu; está a dormir».
De facto, há crianças que não morreram, adormeceram algures mas mantêm-se vigilantes, atentas, presentes, como uma luz que nos ilumina sempre, mesmo na maior das negritudes. Mesmo nessa, ou sobretudo nessa.
JdB
8 comentários:
Caro JB,
Li algures que, para Deus, a morte é um sono. Acredito que sim.
Um abraço e bom Domingo.
fq
Esse sono das crianças, e de outros que partem, é reparador. Tão reparador que conseguimos senti-los dentro de nós. Sem lamentos, sem recriminações, sem angústia. Estão apenas lá. Sempre, de mão dada connosco e para o nosso bem. Thanks JdB pela lembrança.
JdB, perdoe-me o atrevimento, mas quando diz "onde outros vêem uma morte dolorosa, alguns vislumbram um amor limite", apetece-me dizer um amor 'sem' limite, pois é assim que Ele nos ama ... sem limites, sem condições. Como dizem os franceses, on aime pas parce que, mais on aime malgré.... Hoje, na paróquia onde vou, leu-se uma leitura diferente. Porque amanhã é dia de S.Pedro, Padroeiro da Paróquia onde presto serviço (S.Pedro em Alcântara), leu-se Jo.21, 15-19. Esta leitura, onde Cristo pergunta 3 vezes a Pedro se ele O ama, deu-me que pensar. Não basta estarmos certos do amor de Cristo por cada um de nós. Cristo precisa igualmente do nosso amor e precisa que o reafirmemos e que o demonstremos, como dois amantes que não se cansam de trocar palavras e gestos de amor. Esta ideia de que Cristo precisa de mim, precisa da minha boca para se fazer ouvir, dos meus braços para se fazer abraçar, dos meus dedos para servirem de pincéis e, acima de tudo, precisa do meu amor para fazer eco nos corações dos outros, enche-me de confiança, de ternura e alegria. Hoje é Domingo, JdB e também eu não esqueço a minha condição de católica.
Bom domingo a todos.
FQ: um abraço igual.
Ana: Scott Holland diria, na sua famosa prece: "porque é que estando longe do teu olhar, estaria longe do teu pensamento?"
maf: o seu comentário é um post.
JBD,
Já começo a acreditar que, a morte, é mais complicada para os que ficam.
Aqueles que partem, cumpriram a sua missão, entre nós, e vão continuá-la, no além.
As nossas dúvidas sobre o que será a morte, é que nos assusta, pois, aqueles que partem deixam-se ir serenos, parece que têm um alerta físico, e morrem em paz.
É esta inquietude sobre a morte, é que é o nosso inferno.
Não existe para mim inferno, nos termos em que nos são ensinados, por exemplo, na Catequese.
O inferno são todas dúvidas, sobre o que nos transcende.
Deus é Pai, e ama os seus filhos...
Até para a semana....
Cris: obrigado pela visita. Para quem, como eu, acreidta na vida eterna, a morte é apenas o princípio da nossa eternidade, pelo que rezo quase sempre pelos que ficam, porque Deus receberá todos aqueles que não o recusaram ostensiva e continuadamente até ao fim. Deus não é senão amor.
O inferno não existe, como não existe o frio ou a escuridão. São sempre a ausência de Bem, de calor, de luz.
Um escritor russo dizia que nós não temos medo da morte, mas do momento antes da morte...
JDB,
Obrigada. A sua Fé, cultura e bondade de tentar esclarecer sempre as dúvidas dos outros é enorme.
Boa semana......
Querido João,
Continua a ajudar-me a rezar, é inspirador, leva-me mais longe.
Obrigada por estar aqui.
Beijinhos
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