12 outubro 2017

Crónica de um viajante a Washington (2)

Ontem cumpriu-se o segundo dia de reuniões da direcção da Childhood Cancer International, a organização que agrega mais de 180 associação de Pais de crianças / jovens com cancro em mais de 90 países.

Estar com estas pessoas é estar, também, com o melhor e o menos bom destas pessoas. Gente que perdeu filhos, que lutou pelas sobrevivência dos filhos num tempo de menos informação, de menos técnica, de menos internet e de menos apoio. Gente que, podendo largar tudo quando os filhos partiram para o céu ou para as suas vidas felizes ou mais limitadas, decidiu ficar e olhar para os outros e pelos outros. Gente que investe dinheiro, tempo, horas de voo e dos seus tempos de lazer numa tentativa de deixar o mundo um lugar melhor. Foi isto que encontrei de volta de uma mesa quando aceitei o desafio de fazer parte da Direcção, depois de já ver tudo isto nas cadeiras anónimas das palestras anuais.

Por trás desta dedicação totalmente louvável, que nalguns casos vem de muito fundo da alma, há a fragilidade humana: a desorganização das reuniões, as necessidades de atenção, as susceptibilidades, os estilos próprios, os desejos de ficar, porque a saída deste ambiente de solidariedade é o confronto com um certo vazio ou um sentido de desemprego. Talvez achasse, na minha ingenuidade, que o facto de trabalharmos para uma causa tão nobre suscitasse desejos de eliminação de vontades ou fraquezas individuais e nos concentrássemos no que nos une. Mas de facto não é assim, e talvez este ano tenha sentido isso com maior acuidade. Sinto-me, pela minha juventude no cargo ou por alguma característica pessoal que não descortino, como um recipiente de queixas alheias: A queixa-se-me de B, que por sua vez se queixa de A mas também de C e talvez de D, que só se queixa de B...

Estou numa organização humana; talvez, num certo sentido, de seres humanos mais fragilizados. Continuo a ser ex-funcionário de uma multinacional que privilegiava a eficiência das reuniões e a disciplina da agenda. Talvez isso, ao contrário da ignorância que é uma benção, seja uma maldição. O resto é simples: nas fraquezas dos outros vejo as minhas, mesmo que sejam diferentes.

JdB

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