COMO TCHAIKOWSKI AJUDOU OS RUSSOS NA SEGUNDA GUERRA
O famoso compositor do romantismo russo, que compôs árias magníficas para o ballet, Piotr Ilitch Tchaikovsky (1840-1893), não chegou vivo ao século das duas grandes Guerras Mundiais. Mas a sua música sim, pois perdurou para além da longevidade do seu autor, continuando a ecoar nas salas de concerto e nos palcos onde actuam os melhores bailarinos do mundo!
À semelhança de Beethoven, também a Quinta Sinfonia de Tchaikovsky está marcada pelas badaladas do destino, parecendo que o fio da história se limita a seguir um curso predestinado, encurralado na impotência de uma força desconhecida, sujeito a um destino sem liberdade. Até que uma sonoridade vitoriosa desponta no último andamento, abrindo uma brecha de luz num trilho que fora escuro e inquietante para a sede de liberdade que habita o ser humano. Uma das novidades desta obra reside na proeminência das intervenções do clarinete, a quem cabem as primeiras notas do tema inaugural do Destino, numa melodia profunda, que penetra até ao âmago da alma, como é apanágio em Tchaikovsky.
O desfecho positivo da Sinfonia converteu-a num hino de esperança depois de um combate árduo para suplantar os obstáculos e limites que atrapalham o início de um caminho, de uma existência. Desse modo, elevou-se a símbolo de resistência para as lutas mais difíceis. Assim aconteceu durante o ‘Cerco de Leningrado’, durante a Segunda Guerra Mundial, que deixou a população aprisionada durante dois anos e meio, entre 8 de Setembro de 1941 e 27 de Janeiro de 1944. Resultou numa tremenda maratona contra a fome, contra o frio extremo do longo Inverno daquela latitude e contra as doenças provocadas pelo ambiente insalubre da cidade cercada. Para animar o povo sitiado, Estaline deu ordem para a Quinta de Tchaikovsky ser passada repetidamente na rádio, para levantar o moral dos locais. Tornaram-se célebres e heroicas as interpretações da principal formação orquestral da cidade, tocadas em directo e sem interrupções, apesar da saraivada de bombas que explodiam nos céus de Leningrado/ S.Petersburgo (nome de origem, recuperado após o colapso da URSS).
Logo que as tropas nazis cercaram o burgo fundado por Pedro o Grande, na capital da Europa livre, que era Londres, a mesma Sinfonia de Tchaikovsky foi transmitida via rádio na noite de 20 de Outubro de 1941, em resposta ao apelo à resistência lançado por Estaline à sua população. Também na capital do Reino Unido as bombas nazis começaram a rebentar aos primeiros acordes do Segundo Andamento, mas não desmobilizaram a orquestra, que fez gala em tocar a Sinfonia até à última nota! Percebe-se o ódio feroz com que os sequazes de Hitler tentaram, em vão, vergar a resistência britânica – das elites ao cidadão comum – surtindo o efeito oposto ao confirmar a urgência em derrotar o hediondo regime nazi.
Nestes tempos agitados por focos de guerra temíveis e com alto risco de propagação, como o recente conflito deflagrado na Faixa de Gaza, após a chacina e o rapto de israelitas pelo Hamas, a Quinta Sinfonia do grande músico das Estepes da Ásia Central vem mesmo a calhar. É mais uma oferta da Gulbenkian, que a transmitirá em sinal aberto (através das plataformas digitais da Fundação), no próximo dia 13 de Outubro, às 19h00. A Sinfonia será interpretada pela orquestra da Fundação, sob a batuta do jovem maestro nascido no Uzbequistão – Aziz Shokhakimov:
SINFONIA N.º 5 EM MI MENOR, OP. 64
Escrita entre maio e agosto de 1888.
Estreada em S.Petersburgo, no dia 17 de novembro do mesmo ano, dirigido pelo próprio compositor.
Dedicada ao professor e crítico de música alemão (Hamburgo) – Theodor Avé-Lallemant.
ANDAMENTOS
I. Andante providentoso – Scherzo: Allegro con anima
II. Andante cantabile, con alcuna licenza - Non Allegro
III. Valse — Allegro moderato con Patrioso
IV. Finale — Andante maestoso - Molto assai e Molto maestoso - Allegro vivace (Alla Breve) - Allegro con anima
Como observam alguns críticos musicais, a Quinta Sinfonia cumpre com garbo e criatividade a máxima «per aspera ad Astra» (das dificuldades até às estrelas), ao fazer evoluir as lágrimas iniciais para um combate intrépido que desemboca numa marcha gloriosa. Tão actual e necessário o sinal de esperança que Tchaikovsky soube traduzir em música.
(a preparar o próximo gin tónico, para daqui a 2 semanas)
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