23 setembro 2025

De uma mesa cheia de doutorandos

Um dia uma prima contou que, num casamento, lhe havia sido atribuída uma mesa onde estavam três cavalheiros (não afianço o número, mas é irrelevante) que tinham atravessado o Tejo a nado. A probabilidade de isso acontecer é baixa, muito baixa, excepto se pensarmos que o noivo já tinha atravessado o Tejo a nado, pelo que é possível que tivesse amigos - uma espécie de irmandade - capazes de uma façanha semelhante.

No sábado fui a um casamento. Na minha mesa - de oito pessoas - havia cinco doutorandos. A probabilidade de isso acontecer é baixa, muito baixa, excepto se pensarmos que a noiva também é doutoranda e convidou colegas da faculdade, eu incluído. Numa outra mesa havia mais dois doutorandos, também colegas de faculdade.  

Uma mesa de doutorandos é uma mesa divertida? Estou em crer, num pensamento muito repentino, que sim, é divertida (presumindo que as pessoas não são maçadoras) desde que sejam da mesma faculdade. Imagino-me com dificuldades em entabular conversa com um doutorando em matéria negra, na influência dos raios gama no comportamento das margaridas (título de um filme de 1972, que também vi), na definição de estruturas pendulares para o suporte de pontes aéreas ou para os efeitos da gentrificação no bairro do estacal novo. Aqui o grupo era mais homogéneo: para além de mim, havia uma doutoranda em José Régio, outra em João Guimarães Rosa (sobrinha do meu querido amigo fq), um doutorando em Alexandre O'Neill e uma doutoranda a terminar a sua tese (que vou conhecendo bem) sobre a representação social das viúvas, mas numa faculdade diferente. Para todos tenho conversa e ouvidos interessados - confirmo uma suspeita sobre José Régio (de cuja poesia gosto) no livro O jogo da cabra-cega; li há uns bons Grande Sertão: Veredas, motivo de espanto geral, e sou igualmente apreciador de O'Neill. Na mesa ao lado reencontrei mais dois colegas que já fizeram o doutoramento: um sobre Wittgenstein e a noção de casa e outro sobre Sócrates (ou seria Aristoteles?) e Platão.

Um dia perguntei a uma colega que estava a fazer um doutoramento sobre Wordsworth: o que motiva uma rapariga com 25 anos a fazer um doutoramento sobre o poeta inglês? E o que vai fazer com o doutoramento? A resposta foi sequencial: não sei e não sei. Dos dois doutorandos que referi no final do parágrafo anterior, um tirou um curso de programação e exerce esse mister; o outro deu aulas na faculdade - totalmente de graça!!! -  e agora está perdido, sem saber o que fazer. Ambos gostariam de leccionar, n(um)a faculdade, assim como o doutorando em O'Neill. 

Para a minha geração era muito importante ter-se uma ferramenta (a expressão era mesmo essa), isto é, um curso com saída para uma vida profissional. Todos estes doutorandos quererão leccionar? E se sim, onde? E será que o conseguem? E se não conseguirem, fazem o quê?

JdB

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