A tua guerra, essa luta que travas contra mim, contra todos a quem chamas oponentes, é só tua. Começou, eras menino. Houve uns olhos que te olharam e a denunciaram, um coração em desespero que a partilhou contigo, uma boca que não conseguiu calar a voz amargurada da angústia. Há muitos homens em combate como tu. Que arremessam pedras, disparam tiros e põem bombas durante uma vida inteira. Cegos de raiva. Em toda a esquina topam o inimigo, em cada alma auguram o traidor. Carregam desde meninos a dor de alguém que amaram e que os amou, devolvem-na ao mundo, espalham-na à sua volta, sem nunca duvidarem do que sentem. Erguem o indicador sobre quem estiver à mão, em pequena ou grande falha, ignorando que nesse gesto outros quatro dedos apontam, na sua própria direcção. Não reparam, ocupados que estão na sua douta opinião. “Estarei equivocado?”, é questão que não reclama naquelas mentes. As guerras vêem de longe, sim. Destroem o teu mais intenso amor, a tua paz, a fraternidade que tantas vezes apregoas. Há muito, muito tempo, eras tu tão pequenino, e foi profundamente injusto, insano, inconsequente.
Homens, procurem a origem do vosso inferno. Persigam a razão da vossa guerra. Revejam, tim-tim por tim-tim, o que assistísteis quando meninos. De que misérias fostes vós testemunhas caladas entre os jogos de bola, o caminho da escola, os fins de tarde, as manhãs de sábado, os passeios de domingo, a ida à missa? No vosso quarto, à mesa de jantar, no silêncio aterrador da madrugada? Do que sentistéis, talvez não tereis lembrança. Ou surgirão vagas recordações de uma criança simplesmente amedrontada. Mas ficai certos: dentro de vós, como num papiro milenar, se guardam tais vivências descritas ao milímetro. Têm a forma de terríveis consequências e poder sobre a vossa condição. Desabrocham como ervas daninhas entre as vossas opiniões, acções, reflexões. Toldam o timbre das vozes e manipulam os gestos mais naturais. Homens, não se detenham. Procurai a origem do vosso inferno, a razão de toda a guerra, e voai, sem medo.
DaLheGas
Homens, procurem a origem do vosso inferno. Persigam a razão da vossa guerra. Revejam, tim-tim por tim-tim, o que assistísteis quando meninos. De que misérias fostes vós testemunhas caladas entre os jogos de bola, o caminho da escola, os fins de tarde, as manhãs de sábado, os passeios de domingo, a ida à missa? No vosso quarto, à mesa de jantar, no silêncio aterrador da madrugada? Do que sentistéis, talvez não tereis lembrança. Ou surgirão vagas recordações de uma criança simplesmente amedrontada. Mas ficai certos: dentro de vós, como num papiro milenar, se guardam tais vivências descritas ao milímetro. Têm a forma de terríveis consequências e poder sobre a vossa condição. Desabrocham como ervas daninhas entre as vossas opiniões, acções, reflexões. Toldam o timbre das vozes e manipulam os gestos mais naturais. Homens, não se detenham. Procurai a origem do vosso inferno, a razão de toda a guerra, e voai, sem medo.
DaLheGas
4 comentários:
DaLhe, ainda há poucos dia, a propósito do sentimento saudade, um amigo me dizia 'um homem não chora'. Não sei quem foi o homem que inventou essa máxima, mas certamente não era Homem. Solidarizo-me contigo, DaLheChoro e grito: Homens chorem a vossa dor, chorem a vossa saudade. As lágrimas que ficarem presas nas vossas gargantas irão empedernir e tornar-se rochas que vos impedirão de respirar e sufocar-vos-ão.
Belo texto, DaLhe, não cales a tua voz de menina, onde ecoa um coração de mulher. Bj
Grande texto. Enorme sentido. Se me permite, acrescentaria apenas "estamos sempre a tempo". Disso.. e de tudo o resto.
Aceite as minhas flores,
gi.
DaLheGas,
Na minha opinião, todos os homens choram.
Só que o fazem sózinhos, para ninguém ver.
Se homem não chorassem, porque teria bolsas lacrimais?
Bom texto, parabéns....
Obrigada leitores. Que a luz do discernimento ilumine a nossa escuridão, nem que seja tarde e as más horas. E que os que vêem nítida a escuridão dos outros, tenham a coragem de os avisar. Boa semana a todos.
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