Tudo se joga no coração dos Homens.
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Tenho o privilégio sociológico de ter uma actividade voluntária muito internacional, isto é, interajo com pessoas de muitos países. No board da associação na qual sou presidente há um sul-africano, um zimbabweano, uma espanhola e uma chilena, uma canadiana e uma australiana, um neozelandês e um malaio. Fora isso, trabalho muito frequentemente com uma filipina, uma austríaca e um chinês de Hong-Kong. Nos últimos meses interagi muito com gente dos Estados Unidos da América e do Canadá.
Por motivos que não veem ao caso e que seria fastidioso explicar, estamos todos envolvidos numa discussão muito complicada, com tiques de agressividade e de exigências desproporcionadas de uma das partes. A outra parte, que é a minha, junta-se à volta de uma mesa virtual e toma decisões, discute motivações e comportamentos. Há um grupo mais pequeno que discute estrategicamente o que deverão ser os passos seguintes, que tenta ver um pouco além do desfocado e da espuma do imediatismo. Somos, ambos os fóruns, uma espécie de Nações Unidas, com representações de uma dúzia de países.
Aprendemos que somos o que somos e a nossa circunstância ou que somos fruto da genética e do meio ambiente. Ora, um dias destes, na sequência de mais uma ronda de conversas por causa do problema referido acima, dei por mim a pensar: se eu tapasse os olhos, se todos falássemos uma língua comum sem sotaque, não conseguiria identificar a proveniência de cada um dos intervenientes, isto é, não saberia dizer quem é espanhol ou malaio, quem é filipino ou africano. Ou seja, na forma de reagir somos, acima de tudo seres humanos: a chilena é igual ao malaio, eu sou igual ao homem do Zimbabwe, não há diferença entre a austríaca e a filipina. O que nos distingue? De uma forma simplista, o feitio de cada um: há quem seja mais diplomático, mais racional, mais impulsivo, mais reservado ou com horror ao conflito.
Quando comecei nestas lides ouvia muito: atenção que ele é chinês, ou percebe-se logo que é americano ou ainda é natural, são africanos... Acima de tudo somos seres humanos, com desejos de sermos amados, com necessidades de poder ou de auto-estima, com uma obsessão para que tudo seja feito de acordo com as regras. Talvez as nacionalidades se identifiquem melhor na forma de reagir, dizem-me, isto é, um americano reagirá como reage a bélica América, que se sente dona do mundo. Nem nisso estou certo. E talvez tenha percebi isto: no fundo no fundo, somos todos muito mais parecidos do que possa imaginar-se.
Ouvi a frase que encima este texto ontem, na homília da missa em que participei. Se tudo se joga na coração dos Homens, então tanto faz de onde vimos, porque o importante é o que temos dentro de nós. E isso, de alguma forma, é independente da nossa nacionalidade, porque gente boa há em todos os cantos do mundo.
JdB
2 comentários:
Gostei. De mostrar ser o que é, da sua natureza.
Junto duas linhas que deve bem conhecer:
Ricardo Neves, Padre
>>> Podemos não saber o que fazer, mas sabemos sempre o que não fazer.
>>> Deus nunca tira a Vida, Deus dá sempre mais Vida. Pode não ser a Vida que desejamos, mas a Vida que precisamos.
Com estima,
oliveira
Muito obrigado pela sua visita.
Ouvi - e repeti - vezes sem conta a frase de que sabemos sempre o que não fazer. Ainda hoje me martela - ou apenas inspira. A segunda não estava na memória, mas gostei de ler. Uma pérola de sabedoria, igual a tudo o que saía daquela alma tão grande num corpo tão pequeno. Que saudades dele!
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