Hoje é Domingo, e eu não esqueço a minha condição de Católico. Socorro-me do Evangelho de ontem:
«Ouvistes o que foi dito: Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo. Eu, porém, digo-vos: Amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem. Fazendo assim, tornar-vos-eis filhos do vosso Pai que está no Céu, pois Ele faz com que o Sol se levante sobre os bons e os maus e faz cair a chuva sobre os justos e os pecadores. Porque, se amais os que vos amam, que recompensa haveis de ter? Não fazem já isso os cobradores de impostos? E, se saudais somente os vossos irmãos, que fazeis de extraordinário? Não o fazem também os pagãos? Portanto, sede perfeitos como é perfeito o vosso Pai celeste.»
Sei que o tema do perdão já aqui foi apelidado de enfadonho. Sei também que me arrisco, com estes escritos mais militantes, a ver fugir a clientela para blogues mais animados e dedicados aos temas ligeiros da actualidade. Mas, como editor e dono deste estabelecimento, sinto-me no direito a tudo - até ao disparate da minha argumentação, se for esse o caso.
Há muito tempo que estou em crer que há uma dimensão egoísta na forma como se recomenda que as pessoas saiam das suas crises, confusões, tempestades interiores, desajustes com o pequeno mundo em redor: temos de pensar em nós próprios, no nosso bem-estar, no nosso conforto, no nosso equilíbrio, na nossa felicidade, na nossa harmonia. Como se, de alguma forma, o próximo - que é sempre o mais próximo - fosse acessório ou secundário nas prioridades e leis que regem a nossa vida.
O Evangelho de ontem fala do amor aos nossos inimigos e na oração pelos que nos perseguem. Esta atitude de dádiva, de perdão, de tolerância, de compreensão, obriga-nos a sair das nossas certezas, das nossas indiferenças, das nossas raivas e dos nossos azedumes que mascaramos, tantas vezes, com uma frase impactante: preciso de pensar em mim em primeiro lugar, como se um dos nossos defeitos fosse o excesso de dedicação que votamos aos outros.
Talvez não consigamos amar nem rezar pelos que nos maltratam. Mas, se os conseguirmos perceber - uma compreensão activa e não uma indiferença militante - damos um passo importante em direcção ao lado luminoso da vida. Alguém me disse um dia que o perdão era amnésico. Não me parece - talvez seja apenas pacificador, como uma pastilha salvadora que se toma para a azia incómoda.
Termino com a primeira pergunta do sermão do Padre António Vieira de que falei há uma semana: quanto tenho vivido? Porque mais importante do que os anos na nossa vida é a vida nos nossos anos.
JdB
3 comentários:
Parabéns JdB,
Nem que seja só uma pessoa por mês a ler este blog, já fica mais rica, pois o conjunto de pessoas que escrevem, é culto e sem pretenciosismos.
Eu, sou absolutamente viciada nele, pois, todos os dias cá venho para ler as crónicas e depois os comentários.
Alguns cometaristas também escrevem muito bem.
Continuem, nem que seja por mim e por vocês, e pelo vosso empenho.
Um Abraço
Mandei-lhe o site do Teilhard de Chardin. Na sua forma de rezar o Pai Nosso reflecte o perdão desta maneira:
"'assim como nós perdoamos
a quem nos tem ofendido' -
como é difícil este mandamento,
como a todo o momento nós
esquecemos que amar é dar, é dar sempre(que é o que quer dizer
per-donare);é dar a quem não dá,
percebendo as razões desse não
dar."
Esta meditação reforça a sua "desinstaladora" mensagem.
Beijinhos
JdB, enfadonho foi um termo que eu (também?) usei no comentário que fiz á imensa e longa discussão do perdão. Parece que o sensibilizou. Porém, não é o tema do perdão que é enfadonho. Não confundamos as coisas.
Os seus pensamentos de Domingo são, na maioria das vezes, refrescantes e não maçadoramente militantes. Deve continuar mesmo que ache que ninguém os lê. Faz-nos sempre bem escrever sobre o que pensamos, sobre o que achamos certo porque , na maioria dos casos, não o praticamos na sua plenitude. Digo mais, nem temos consciência da distância que nos separa entre o que pensamos, dizemos e fazemos.
Enviar um comentário