08 setembro 2022

Da TAP e das low-costs

 Há duas semanas, um post no Linkedin sobre a TAP - especialmente sobre um acontecimento com troca de aviões, que foi noticiado nas televisões - gerou, quase de imediato, mais de 100 comentários. Os campos eram ferozmente opostos: a TAP como uma companhia má versus a TAP como uma companhia boa. Falamos do tempo actual e não falamos de segurança de voo. Eu sentei-me claramente na bancada dos que acham a TAP uma companhia má. Na minha avaliação não entra a componente sustentada no raciocínio: o que a TAP devia ser para aquilo que nos custa. Avalio a TAP por aquilo que é.

Um dos problemas que eu tenho com a TAP é a memória. É diferente avaliar a TAP quando se viaja na companhia há quase 50 anos ou avaliar a TAP quando se viaja na companhia há 10 ou há 15 anos. Também é diferente avaliar uma companhia aérea (qualquer que ela seja) quando se conheceu o que era a realidade das viagens aéreas há 40 ou 50 anos.

Há 50 anos o turismo era uma actividade de elites. Embarcava-se com uma roupinha mais composta, a profissão de assistente de bordo estava envolvida numa aura de beleza e glamour. Os bilhetes de avião eram caros e o serviço a bordo (na TAP, muito em particular) era de excelência: aperitivo, talheres de metal e copos de vidro, ementa em papel de boa gramagem, opção de peixe ou carne, refeições quentes e possibilidade de um digestivo. Não falo de longo curso - esta era a realidade numa viagem Lisboa - Londres. E voos nem sempre cheios, o que não é despiciendo. Foi esta a realidade que eu conheci, a voar na Europa ou em longo curso. A TAP estava seguramente nas cinco (para não ser muito ousado) melhores companhias do mundo.

Hoje o turismo é de massas. A segurança a bordo obrigou ao plástico, o ambiente obrigou à madeira. A necessidade de reduzir custos substituiu a refeição quente por uma sandes má de atum, a necessidade adicional imitou o costume das low-costs: comida paga. A profissão de assistente de bordo perdeu o glamour - hoje serão pouco mais do que empregadas de mesa (com todo o respeito) que circulam entre aeroportos e aviões, cuja actividade principal é servir clientes nem sempre educados. Uma viagem de avião deixou de ser um acontecimento para ser um mal necessário para quem quer ir de A para B. 

O que diferenciava a TAP de uma low-cost não era só o preço do bilhete - era também a qualidade dos vários serviços - de embarque e a bordo. Hoje já não é isso as que diferencia. O serviço numa low-cost não engana, já que não podemos esperar mais com aquilo que pagamos. Ora, a TAP não cobra bilhetes de low-cost, mas presta serviço de low-cost: o serviço informativo no embarque é mau (tenho várias experiências), a comida a bordo quase nunca chega. Neste afã de eliminar o desperdício, e ao contrário do que diz o adágio popular, decidiu-se que faltar era melhor do que sobrar. Diz-me uma assistente de bordo (que teve a amabilidade de disponibilizar um copo de vidro para eu não ter de beber vinho com sabor a cartão) que em todas as viagens se pede mais sanduíches. E em todas as viagens faltam sanduíches, porque não disponibilizam mais. Antes sobre do que faça falta é um pensamento a não seguir.

Falando em bom português, o meu problema com a TAP é dois. De facto, vi a degradação (replicada em muitas companhias aéreas) de uma companhia fantástica - maldita memória de outros tempos. Por outro lado, o serviço é mau (e pelo mesmo preço não tinha de ser tão mau), pese embora o esforço de alguns profissionais. De tudo isto safam-se os que começaram a viajar na semana passada - nunca conheceram outra realidade. 

Nota final: viajei na TAP 3 ou 4 vezes nos últimos 3 meses. Costumavam pedir-me para responder a um inquérito; deixaram de o fazer, talvez pelo meu tom excessivamente crítico. Qualquer dia eliminam-me o número de passageiro frequente.

JdB 

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