Kuching (Malásia, Ilha de Bornéu) |
A minha viagem ao sudeste asiático reveste-se de um duplo objectivo: (i) assistir a uma conferência com organizações de crianças com cancro / pais / sobreviventes da Ásia e (ii) fazer férias.
A conferência tem várias valências, das quais irei falando no futuro. Tem uma característica relevante, que é o facto de se conviver de forma próxima, durante 2 dias, com pessoas muito diferentes, unidas, sobretudo pela oncologia pediátrica - podem ser médicos, sobreviventes, pais. Na mesma sala estavam pessoas do Líbano ou do Japão, da Malásia ou do Bangla Desh, de Singapura ou da Índia ou da China. Sim, são todos asiáticos, mas são diferentes - muçulmanos, cristãos, budistas, hindus; gente com tradições diferentes, com hábitos diferentes, de cores diferentes.
O contacto com esta panóplia humana permite que eu identifique características pessoais (muito embora não se aplique a esta comunidade): entre mim e uma espécie de falta de paciência pela espécie humana está um fio de cabelo. Eu explico: não tenho preconceitos de beleza, isto é, para mim as pessoas podem ser muito bonitas ou muito feias, não lhes ganho aversão ou proximidade por isso. As pessoas podem ser amarelas ou pretas, não lhes ganho aversão ou proximidade por isso. Dentro de limites, as pessoas podem ter opções políticas diferentes das minhas, não lhes ganho aversão ou proximidade por isso. Onde está o meu preconceito: na ideia que tenho de civilização, de comportamento social, de regras de educação.
O preconceito é uma arrogância. Aquilo que me separa de uma certa espécie de chineses (com quem viajei de Kuching (Malásia) para Singapura, é a noção de civismo. Falam alto e muito, não respeitam o espaço das pessoas, comem de boca aberta, estão de chapéu de pala (muitas vezes posto ao contrário) dentro de casa. A arrogância deriva do facto de eu me entender detentor do conceito de civismo, de ser eu (e a comunidade social onde me insiro) a dizer que não se come de boca aberta, que não se fala alto num avião, que se respeita o espaço do outro e que não se toma uma refeição de "caviada", a revelar ao mundo uma pilosidade abundante e suada. A arrogância deriva do facto de eu não ter esses comportamentos e, por isso, me considerar civilizado.
Conheço gente cujo preconceito são os gordos e feios; dizem, em sua defesa, que são estetas. Ninguém no seu perfeito juízo dirá que isso é um preconceito, toda a gente gosta de beldades delgadas. Ora, em minha defesa direi também que sou um esteta - acontece que o meu olhar arrogante não se fixa no físico, mas no comportamento; não avalio a esbeltez de um par de pernas ou o fascínio da cor de uns olhos, mas avalio a forma como a pessoa se comporta em sociedade. Em bom rigor, o civismo é uma estética.
JdB
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