Hoje, em pleno mês de
férias para tanta gente, vem a propósito a reflexão do P.Tolentino Mendonça sobre
o tempo de descanso e de desintoxicação do dia-a-dia comum:
«Férias: A possibilidade de reencontrar a vida
Este vaivém que Julho e Agosto
introduzem (com viagens mais próximas ou longas, tráfegos de vária ordem,
alterações ao quadro de vida corrente…) constitui, para lá de tudo o mais, uma
espécie de coreografia interior. Dir-se-ia que a própria vida solicita que a
escutemos de outra forma. De facto é disso que se trata, mesmo que se não diga.
É com esse imperativo que cada um de nós, mais explícita ou implicitamente,
luta: a necessidade irresistível de reencontrar a vida na sua forma pura.
Se a linha azul do mar tanto nos
seduz é também porque essa imensidão nos lembra o nosso verdadeiro horizonte.
Se subimos aos altos montes é porque na visão clara que aí se alcança do real,
nessa visão resplandecente e sem cesuras, reconhecemos parte importante de um
apelo mais íntimo. Se buscamos outras cidades (e nessas cidades uma catedral,
um museu, um testemunho de beleza, um não sei quê…) é também perseguindo uma
geografia interior. Se simplesmente investimos numa dilatada experiência do
tempo (refeições demoradas, conversas que se alongam, visitas e encontros) é
porque a gratuidade, e só ela, nos dá o sabor adiado da própria existência.
Renoir, Piquenique
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Entendemos bem aquele verso de
Ruy Belo que diz: «Espero pelo verão como
quem espera por uma outra vida». Na verdade, não é por uma vida estranha e
fantasiosa que esperamos, mas por uma vida que realmente nos pertença. Por isso
é tão decisivo que as férias, tempo aberto às múltiplas errâncias, não se torne
um período errático e vago; tempo plástico e criativo e não se enrede nas
derivas consumistas; tempo propício à humanização não se perca na fuga a si
mesmo e no ruído do mundo. Em toda a tradição bíblica o repouso é uma
oportunidade privilegiada para mergulhar mais fundo, mais dentro, mais alto. É
aceitar o risco de sentir a vida integralmente e de maravilhar-se com ela: na
escassez e na plenitude, na imprevisibilidade dolorosa e na sabedoria
confiante.»
Edward Potthast, Na praia
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José Tolentino Mendonça
In O hipopótamo de Deus e outros textos, ed. Assírio e Alvim
In O hipopótamo de Deus e outros textos, ed. Assírio e Alvim
ÓPTIMO VERÃO para todos!
Maria Zarco
(a preparar o próximo gin tónico,
para daqui a 2 semanas)
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