Regressei ao campo francês depois de duas curtas estadias: em 2002, no Club Med da Provence, e em 2007, numa viagem por alguns castelos do Loire. Agora estou numa zona diferente e, de caminho para uma pequena aldeia chamada Fleurence, olhei para tudo com mais atenção.
O que diferencia o campo francês do campo português, nomeadamente o do norte? Se eu quisesse fazer graça, diria que são as casas dos emigrantes. De facto, há por aqui emigração portuguesa – não só me dizem que há, o que é um bom indicador de que de facto há, como vi uma casa que ostentava à porta uma indicação, talvez em azulejo, com o o nome: “Le Portugues”. Mas o português aqui é imigrante e em Portugal é emigrante. E este simples letrinha no início da palavra marca toda a diferença. Aqui, o Sr. Silva constrói uma casa que se assemelha às dos outros franceses que por aqui vivem. Em Portugal, recheado de poupanças feitas ao longo de uma vida de trabalho árduo, o mesmo Sr. Silva constrói uma casa cujo figurino saiu da cabeça dele, não da Gasconha, onde estou agora e alguns desses senhores silvas viverão. O Sr. Silva goza, em Portugal, de uma liberdade que não goza aqui. Nesta zona, o Sr. Silva tem um gosto local. No norte de Portugal tem um gosto que sai de uma imaginação fértil e de uma vontade forte. Ser-se emigrante ou imigrante não é apenas uma questão de sair de ou de entrar em.
Este campo onde estou agora é muito bonito, suavemente ondulado, mais perto da planície alentejana do que da fraga beirã. Está bem arranjado, sugerindo trabalho, ocupação e aproveitamento. Não sei se é ilusão de óptica se resultado de uma Política Agrícola Comum que, dizem, foi toda construída para salvar a agricultura gaulesa à custa, entre outras, da portuguesa. As vilas estão muito bem arranjadas – lá está..., não há casa de emigrante. Os centros históricos bonitos, bem cuidados, com feiras de rua que também se vêem em qualquer localidade de Portugal: roupa, vegetais, plásticos, peças de joalharia caseira, sapatos a esmo. As praças, ocupadas, têm esplanadas onde um café e uma meia de leite custam 3,10€ - e não têm uma qualidade dupla que acompanhe o dobro do preço.
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Ontem de tarde, após um calor que aumenta exponencialmente com o avançar do dia, e depois de uma trovoada seca, ruidosa e próxima, choveu durante breves horas. O ar fica mais limpo, mais fresco; cheira a terra molhada, a Outono, a dias que encurtam. É apenas uma ilusão, uma breve ilusão, porque o sol regressa (volta o sol e tu não voltas, cantará um fado) e com ele o calor, pese embora se diga que a temperatura vai baixar. Mas durante estas módicas mas caridosas horas, chega-nos a esperança de uma estação do ano que virá acompanhada de tréguas da canícula, de aromas de urze e de lama e, talvez, de um recolhimento de que todos precisamos, ainda que não o reconheçamos.
Estou num sítio bonito, com amigos, numas férias curtas, propositadamente curtas, onde a agitação física se faz de volta de um tacho, de um copo de vinho, de um livro e de uma conversa quase permanente em inglês. Este breve momento outonal foi quase redentor, como se ampliasse dentro de mim o desejo pacífico de me lembrar do que me faz falta: a minha geografia de espaços e de pessoas, as rotinas e os sons, o esvoaçar das borboletas.
JdB
2 comentários:
Que beleza! Entendo a vontade de um campo libertador. Parece que ai se respira,
Por aqui prepara-se o regresso a casa.
«Regardons vers le pays de France » por onde começámos a amar essa
Douce-France
Cher pays de mon enfance
Bercée de tendre insouciance
Je t' ai gardée dans mon coeur!
Oui je t'aime
Et je te donne ce poéme...
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