19 setembro 2013

Crónicas de um mestrando tardio

Passei os últimos anos da minha vida profissional por conta de outrém a integrar grupos de trabalho relacionados com processos: definição, agilização, redução de burocracia, eficácia, comunicação, circuitos mais certos, etc. Quando, numa fase mais recente da minha actividade, dei formação, também falei sobre isso, quase sempre na administração pública para quem um papel, uma assinatura, um circuitozinho mais complexo são uma delícia irrecusável.

Desde 2ªfeira que sou aluno do mestrado em Teoria da Literatura na Faculdade de Letras de Lisboa. Ontem passei pela penosa tarefa de tentar inscrever-me, pois aos alunos do primeiro ano está reservada a via sacra da inscrição presencial. À entrada da faculdade está um jovem estudante que orienta os alunos. Recebi uma senha para ir à sala 1.1. Antes teria de deslocar-me à Tesouraria, onde deveria tirar outra senha. Quando indaguei quanto tempo poderia demorar todo o processo responderam-me: se não estiver ninguém 20 minutos; se estiver gente várias horas. O coração disparou de nervos, agravado por alguém que dizia, alarmado, que o sistema estava em baixo (o sistema é uma palavra terrível, que quer dizer tudo e não dizer nada...). Na véspera tinham sido duas horas, impossibilitando tudo o que fosse trabalho burocrático de inscrição de alunos.

Na Tesouraria, tirada a fatídica senha, esperei 1,5 horas para ser atendido. Umas vezes está uma funcionária, outras vezes estão duas, por vezes não há ninguém. O processo é lento e a impressora debita recibos em A4 que a funcionária, diligente e saudosa, corta com uma tesoura em duas folhas A5. Naquele tempo de espera alguém interpelou uma senhora que me pareceu ter ar de dirigente. Nestas situações alega-se sempre o mais fácil: é preciso mais gente. A senhora, com um sorriso matreiro, argumentava: peçam ao passos coelho, peçam ao passos coelho. A ninguém ocorre - e talvez não me ocorresse a mim, se me sentisse devorado por uma máquina pública ineficiente e que não premeia a competência - que menos gente pode ser um desafio para a criatividade e para a simplificação.

A mudança de um histórico de multinacional para os bancos da universidade pública pode ser um exercício doloroso. 20 anos de simplificação de processos e formações organizadas com um conforto mínimo criam vícios, e a não satisfação da adição provoca ressacas... O rol de queixas vai longo, pelo que me fico por aqui. Oportunamente escreverei sobre os seminários a que já assisti, que são o contraponto luminoso desta ineficiência burocrática.

JdB

Fotografia do homem de Azeitão (não sei se já foi publicada...)

     

3 comentários:

LA disse...

Azar teu, em compensacao fui recentemente tirar o passaporte em Cascais 15 minutos para encomendar, 15 minutos para retirar, sem precisar de levar fotos, sem senhoras com tesouras. A ultima vez em Portugal tinha sido em Setubal porque Lisboa estava tao cheia que se tinha que ir para o Gov. Civil de vespera e mesmo assim foram umas 4 horas. Parabens pelo curso! Espero maravilhas.

Anónimo disse...

Pelos vistos, a Nova ao lado da Clássica é um oásis burocrático :) Bjs. pcp

Anónimo disse...

Na faculdade de direito, parece que já no tempo do Caetano se gozava com a ineficiência à prova de bomba "da faculdade em frente"; há coisas que nunca mudam.

Sim a fotografia já foi publicada e muito apreciada (pelo menos por mim). Um encore não faz mal nenhum.

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