A Europa e a Realidade*
Em meados de 2005, que para o assunto em questão, foi há muito tempo atrás, Mark Leonard, especialista inglês em política internacional, publicou um livro chamado Século XXI – A Europa em Mudança. Livro esse que, ironicamente, previa a liderança do mundo por parte da Europa nos tempos vindouros. Leonard, imprimindo um evidente idealismo, considerava que o Modus Vivendi do velho continente, com destaque para o seu património cultural e intelectual, bem como pela relativa coesão social, seria adoptado, num futuro não muito longínquo, pela maioria dos países do mundo.
Contudo, apesar das benignas previsões do jovem inglês, nada se concretizou. Com o despertar da crise financeira de 2008, fortemente induzidos pelas diretrizes de Bruxelas, os governos europeus incorreram em doses maciças de despesa pública para fazer face ao ciclo económico recessivo. Porém, os gastos governamentais em muito superaram a receita fiscal, tendo como consequência a criação de elevados défices e inevitável incremento da dívida pública. No caso português, de 2005 a 2011, a dívida duplicou. Refira-se que, já muito antes do apogeu da crise, a despesa estatal era considerada elevada relativamente ao produzido pela economia.
No começo do ano de 2010, os investidores entraram numa espiral de desconfiança quanto às reais capacidades de estados como Grécia, Irlanda e Portugal em pagarem a dívida acumulada. A partir desse período, sempre que os tesouros nacionais emitam dívida no mercado, apenas em troca de incomportáveis taxas de juro a mesma era colocada. A situação tornou-se insustentável e os demais países que integram a união monetária, fazendo as vezes dos mercados, contribuíram para um plano de resgate aos estados em apuros. Em troca do auxilio, os governos de Grécia, Portugal e Irlanda comprometeram-se a aplicar exigentes programas de equilíbrio das contas públicas. Como seria expectável, dado a suspensão do sonho europeu em matéria de criação de emprego e estímulos ao investimento e consumo, o palco para o surgimento de partidos populistas, de esquerda e de direita, estava montado. Por um lado, nos países onde foi aplicado a inevitável austeridade, os movimentos políticos de esquerda reclamam medidas que favoreçam o crescimento e combate ao desemprego. Já nos países a cujos cofres públicos foram retiradas consideráveis somas para ajudar os estados endividados, pularam para a ribalta partidos euro-cépticos que, num tenebroso desvario demagógico, aliciam as populações com discursos nacionalistas.
Por tudo o que a realidade demonstra, o auspicioso futuro da humanidade, com centro na Europa, previsto por Mark Leonard, não passa de uma valente utopia.
Pedro Castelo Branco
* artigo inicialmente publicado no site portugueseindependetnews.com
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