Entre o bater rasgado dos pendões
E o cessar dos clarins na tarde alheia,
A derrota ficou: como uma cheia
Do mal cobriu os vagos batalhões.
Foi em vão que o Rei louco os seus varões
Trouxe ao prolixo prélio, sem idéia.
Água que mão infiel verteu na areia —
Tudo morreu, sem rastro e sem razões.
A noite cobre o campo, que o Destino
Com a morte tornou abandonado.
Cessou, com cessar tudo, o desatino.
Só no luar que nasce os pendões rotos
’Strelam no absurdo campo desolado
Uma derrota heráldica de ignotos.
Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"
***
Aos Vencidos
Quando é que emfim virá o claro dia,
- O dia glorioso e suspirado! -
Que não corra mais sangue, esperdiçado
Á luz do Sol que os mundos alumia?! -
Que os vencidos não vejam a agonia
Do seu tecto de colmo incendiado,
E se ouça retumbar o monte e o prado,
Ao tropel da velloz cavallaria?!
Quando é que isto será? - Quando na vida,
Virá ella, a doce hora promettida,
Hora cheia d'amor, e desejada!...
Em que fataes Cains, fartos da guerra,
Nosso sangue não beba mais a terra...
- E nem mesmo a Justiça use d'Espada?!
António Gomes Leal, in 'Claridades do Sul'
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