Marraquexe, Abril de 2017 |
O absurdo e o mistério
«Diga-me, em cinco minutos, a substância da sua experiência de filósofo.» - «É a escolha entre duas soluções: o absurdo e o mistério. O meu colega Sartre escolheu o absurdo, eu o mistério.» - «Mas qual é a diferença? Também o mistério parece absurdo!» - «Não, o absurdo é um muro impenetrável contra o qual se esmaga num suicídio. O mistério é uma escada: sobe-se de degrau em degrau para a luz, confiando.»
São estas algumas das frases de um diálogo ocorrido em 1983 entre o presidente francês François Miterrand e o filósofo católico Jean Guitton. É verdade que em cinco minutos só se pode dizer pouco, mas também se é estimulado e aprofundar e a colher o essencial.
A opção do filósofo Jean-Paul Sartre é conhecida e já está nos títulos de algumas das suas obras, como “O ser e o nada”, “O muro”, “À porta fechada” e, por fim, “A náusea” e “Com a morte na alma”. Muitas pessoas que passam e se sentam junto a nós, sem nunca terem lido uma linha de Sartre, partilham na prática esta decisão.
Estamos imersos num mundo absurdo e repugnante, no qual as portas das respostas estão todas fechadas e indisponíveis, e o horror é a marca da nossa existência. A liberdade impele-nos a ultrapassar esse muro, mas estamos destinados a partir as mãos e a esmagar-nos contra ele se o tentamos escalar.
Muito diferente é a conceção de Guitton, que vê o ser como uma escada aberta aos nossos passos. É um pouco como a de Jacob, que «viu uma escada apoiada na terra, cuja extremidade tocava o céu» (Génesis 28, 12).
A subida é cansativa, pode-se tropeçar porque os primeiros degraus estão na escuridão, mas lá em cima há uma luz infinita. Com o archote da esperança e com o desejo da procura pode-se prosseguir de etapa em etapa, de luz em luz…
Card. Gianfranco Ravasi
Presidente do Conselho Pontifício da Cultura
In "Avvenire"
Trad.: SNPC
Publicado em 18.11.2017
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