02 janeiro 2019

Vai um gin do Peter’s ?

AREIA CONVERTE-SE EM PRESÉPIO, NO VATICANO 

Este ano, a presença da Gruta de Belém na Praça de S. Pedro é surpreendente, composta pela areia das praias e dos desertos. Neste caso, vem de um povoado marítimo da província de Veneza – Jesolo. 

Imagem de REUTERS/Alessandro Bianchi, de 6.Dez.2018. 

A extrema pobreza e fragilidade do material contrasta com a escultura magistral, que se submeteu a uma beleza de duração breve, como os fósforos que aqueceram um pouco a noite gélida da menina do célebre conto de Hans Christian Andersen.

Explica Richard Varano: «It’s an ephemeral art in the sense that it is not intended to last forever, (…) even though we could make it last indefinitely if we wanted to.»  Imagem da REUTERS/Alessandro Bianchi [https://www.newsbook.com.mt/artikli/2018/12/06/photos-vaticans-st-peters-square-gets-720-ton-sand-nativity-scene/?lang=en8]. 

A Natividade instalada no exterior da Basílica de S.Pedro partiu da iniciativa de um americano premiado na arte efémera da moldagem na areia. A envergadura da obra levou-o a formar equipa com outros craques, redundando numa parceria entre os EUA, a Rússia, a Holanda e a República Checa. Qual jogo sem-fronteiras entre ocidentais imbuídos de Boa-Vontade e talento, a internacionalidade do quarteto confirmou os méritos da entreajuda.  

A holandesa, o russo, o norte-americano e o checo. 

Numa explosão artística que guardou o melhor das brincadeiras da infância, o Presépio do Vaticano acabou por ter origem na ousadia do mais velho dos 4 escultores – o americano nascido junto a uma das praias da Flórida, que arriscou especializar-se no jogo da mais tenra idade. Colocar uma das suas obras-primas no coração da Cidade Eterna tocou-lhe fundo, sentindo a vizinhança da Arte de génios como Leonardo, Michelangelo, Rafael, Bernini, etc. Assumiu sentir-se um anão, por múltiplas razões: «It is an incredibly humbling experience to be here (…) To be surrounded by such history, and art, and beauty, and magnificence, is quite humbling. (…) In the big picture, the largest difference probably between this and any other show I’ve done is it’s all about the sand sculpture, but we’re like the smallest part of the whole [operation] (…) kind of dwarfs what us sculptors are doing. We’re here for 15 days doing the sculpture, but I was also here for a week before doing the preparation.»

Sobre a escolha do Presépio diz Varano: «The theme and the motif of the nativity is just such a graceful and joyful experience, whether you’re working to create something that reflects it or just experiencing it by seeing it. (…) For me that’s been such a spiritual fulfillment.» Imagem da BBC [www.bbc.com/news/world-europe-46591761].

Resguardado numa estrutura de vidro construída para o efeito,  o Presépio estará patente até 13 de Janeiro. 

Os números deste Presépio são impressionantes e a mensagem que o Papa Francisco retirou de uma obra tão invulgar também, reavivando o sentido ulterior do nascimento de Jesus(1):   

«Este ano, o presépio da praça de S. Pedro é uma escultura de areia com 16 m de comprimento, 5 m de altura e 6 m de profundidade. Foram precisos 20 camiões grandes para transportar 700 toneladas de areia oriunda de Jesolo, no Norte de Itália, para a praça de S. Pedro. 10 operários realizaram a operação de compactar a areia, para a tornar mais consistente, e depois montaram a cobertura que protege o conjunto da intempérie. Nas duas semanas seguintes, 4 escultores internacionais com experiência neste tipo de material juntaram esforços para esculpir as figuras: Richard Varano (dos Estados Unidos), Ilya Filimontsev (da Rússia), Susanne Ruseler (da Holanda) e Rodovan Ziuny (da República Checa). Richard Varano conquistou 11 vezes o título mundial de escultura na areia e os outros são também escultores de topo na especialidade.

O relevo divide-se em três grandes painéis: a Sagrada Família no centro, do lado esquerdo a adoração dos pastores e à direita os reis magos. Além disso, vários Anjos povoam o cenário. Todas as figuras convergem para o Menino Jesus, em grande destaque.

O município de Jesolo organiza presépios de areia há bastantes anos, mas desta vez o desafio era maior. Os 4 escultores escolhidos pelo município não queriam apenas surpreender turistas, queriam levar os peregrinos a rezar. (…) (O) momento culminante das duas semanas de trabalho foi o dia 7 de Dezembro, quando Francisco desceu à praça de S.Pedro, para ver o presépio e a árvore de Natal que o acompanha. Entusiasmado com a expressividade e beleza do conjunto, o Papa alongou-se numa meditação profunda sobre o Natal, transmitida na televisão de vários países.

A árvore e o presépio são «dois sinais que nunca perdem a força do seu fascínio e nos ajudam a contemplar o mistério de Deus feito Homem para estar próximo de cada um de nós» – disse Francisco. «Este abeto vermelho, com uma altura de mais de 20 m, simboliza Deus que, com o nascimento do seu Filho Jesus, Se abaixa até aos homens para os levantar dos nevoeiros do egoísmo e do pecado. O Filho de Deus assume a condição humana para a atrair a Si e a tornar participante da sua natureza divina e incorruptível».

A areia daquele presépio, «material pobre, simboliza a simplicidade, a pequenez com que Deus Se mostrou no nascimento de Jesus, na acomodação precária de Belém. Poderíamos pensar que esta pequenez esteja em contradição com a divindade, a tal ponto que alguns consideraram [a humanidade de Cristo] como se fosse uma aparência, um revestimento. Pelo contrário. A pequenez é liberdade. Quem é pequeno, no sentido evangélico, não só anda ligeiro, mas livre de toda a mania de aparecer e de toda a pretensão de sucesso; como as crianças que se expressam e vivem com espontaneidade. Todos somos chamados a ser livres diante de Deus, a ter a liberdade de uma criança diante do seu Pai. O Menino Jesus, Filho de Deus e nosso Salvador, aqui no presépio, é Santo na pobreza, na pequenez, na simplicidade, na humildade». (…)

Para aqueles escultores e para toda a equipa, o presente de Natal tinha chegado mais cedo (…) (ao) ouvir a sua obra interpretada ao vivo pelo próprio Papa!….» 

Artigo gentilmente cedido pelo autor
José Maria C.S. André, publicado a 17 de Dez.2018, em media e blogs 

Aos que embarcaram na aventura de trazer um areal para o Vaticano e transfigurá-lo em Natividade aplica-se a máxima do grande Mestre da língua portuguesa:

«PARA ENSINAR É PRECISO AMAR E SABER,  PORQUE
     QUEM NÃO AMA NÃO QUER, E QUEM NÃO SABE NÃO PODE.»
                          _________________________
             P.António Vieira (1608-1697) in «Sermão do Espírito Santo», Parte II.

No fundo, amar, saber e dar-se têm o expoente num Nome que, no Natal, nos é oferecido por inteiro, para re-insuflar de vida o Novo Ano. Os verbos fortes escolhidos por Vieira evocam o essencial sobre o Menino de Nazaré: na génese do Amor a gratuitidade; no expoente da Omnisciência a Caridade. O primeiro doa-se livremente. O segundo oferece quanto é ao partilhar quanto tem, quanto pode, quanto sabe. Só por si, conhecer muito, dá em pouco para falar à humanidade e fazer eco até ao fundo da alma… pelo que o conselho de Vieira nos interpela a uma sabedoria bondosa, ideal para entrar em 2019.

Continuação de B O A S – F E S T A S  a todos,

Maria Zarco
(a  preparar o próximo gin tónico, para daqui a 2 semanas, numa Quarta-feira)

6 comentários:

Anónimo disse...

Dizer bem quando é para elogiar.
Censurar quando se deve censurar.
A citação de António Vieira está errada. Logo, de caras, não fazia sentido.

As melhorss

ACC disse...

que maravilha!
para além de tudo e tudo, juntam-se gentes de culturas diferentes, com vidas diferentes e que, para além das artes, o que os une é a fé de que juntos podem fazer melhor.

Anónimo disse...

Agradeço aos dois leitores do "gin" os comentários. Sobre a citação de Vieira, de facto, confirmei estar correcta e tenho o maior gosto em citar o parágrafo completo onde consta, que é o primeiro da parte II do «Sermão do Espírito Santo». A versão portuguesa a que tive acesso é ligeiramente diferente, mas respeita em pleno o sentido desta versão, que agora encontrei com o parágrafo completo, pelo que é essa a transcrita: «Ille vos docebit omnia. Diz Cristo aos apóstolos que o Espírito Santo os ensinará. E ser Cristo, ser o Filho de Deus o que diz estas palavras, faz segunda dificuldade à inteligência e razão delas. Ao Filho de Deus, que é a segunda Pessoa da Santíssima Trindade, atribui-se a sabedoria; ao Espírito Santo, que é a terceira Pessoa, o amor; e suposto isto parece que a Pessoa do Espírito Santo havia de encomendar o ofício de ensinar à Pessoa do Filho, e não o Filho ao Espírito Santo. Que o amor encomende o ensinar à sabedoria, bem está; mas a sabedoria encomendar o ensinar ao amor: Ille vos docebit? Neste caso sim. Porque para ensinar homens infiéis e bárbaros, ainda que é muito necessária a sabedoria, é muito mais necessário o amor. PARA ENSINAR, SEMPRE É NECESSÁRIO AMAR E SABER, PORQUE QUEM NÃO AMA NÃO QUER, E QUEM NÃO SABE NÃO PODE; mas esta necessidade de sabedoria e amor não é sempre com a mesma igualdade.» Vou pedir ao dono do blog para completar no "gin" a referência ao Sermão de onde foi retirada a citação. Votos renovados de FELIZ ANO DE 2019, M.Zarco

Anónimo disse...

É estranho o post de Maria Zarco.
Como é que diz que confirmou que a citação está correcta quando, quase no fim do post, pranta a dita citação na forma que eu reconheço como certa?
É um «AMA» ! «NÂO AMA» que estão no cerne do desacordo que, afinal, não é só meu.

Eu não gosto de fazer votos, desejos ou outra manifestação 'clássica'. Aprendi, há pouco, que nem em eleições damos votos: só os emprestamos por um período X...

Eu peço a Deus, Senhor do Universo, que concretize os pedidos que recebe no período mais breve que Ele entender.

ea

Anónimo disse...

Tem razão. Foi mesmo falha minha ter falhado o «não», que altera o sentido. Vou pedir para ser feita essa correcção. Muito obrigada pelo alerta. maria zarco

Anónimo disse...

Maria Zarco,
Não sei quem é, e isso para nada interessa.
Interessa, e muito, o trabalho desenvolvido aqui no «Adeus, até ao meu regresso».
Trabalho insano, como é todo aquele que é feito com amor (este sempre foi insano).
Por vezes, felicito-a. Outras muito mais raras, critico-a.
Pela graça do Alto, encontramo-mos.

Sempre com estima, cumprimento-a
ea

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