21 janeiro 2022

Dos relógios e dos fetiches

Amigo próximo, entendido e apreciador de relógios, mandou-me o link para um artigo publicado no site da CNBC cujo título era: Patek Philippe’s Tiffany Blue Nautilus watch fetches $6.5 million at auction. Ou seja, para quem é menos versado na língua inglesa, um modelo específico de relógio da Patek Philippe atingiu os 6.5 milhões de dólares num leilão. O fabricante de relógios havia descontinuado o modelo - preço de catálogo de 52.000 dólares - e fizera uma edição limitada de 170 unidades. 

O Tiffany Blue Nautilus (imagem tirada do artigo citado)
Sobre este relógio - sobre este modelo específico - não passou a patine do tempo ou a exclusividade de um modelo único; não foi usado por assassinos famosos nem por assassinados famosos, não incluía poeira da lua ou pó dos anjos na sua lista de materiais. E, no entanto, foi vendido por 120 vezes mais o seu valor numa loja.

Diz ainda o artigo (numa tradução livre minha): o relógio, leiloado pela Phillips em associação com a Bacs & Russo de Nova York, foi o primeiro de 170 edições limitadas do Nautilus Ref. 5711 que serão feitos e vendidos em algumas boutiques Tiffany. O relógio será vendido oficialmente por cerca de US $ 52.000. No entanto, como a procura supera em muito a oferta e é o relógio novo mais popular [hottest new watch, no original], os coleccionadores ricos estavam dispostos a pagar muito mais pelo primeiro a ser colocado à venda.

Qual a diferença entre este relógio e o segundo que for posto à venda numa loja? Nenhuma. E entre este relógio e o quinto, ou o 170º? Nenhuma. Ninguém, em momento algum, vai ler no pulso do coleccionador que aquele relógio específico - aquele exemplar - foi o primeiro a ser vendido e que, por isso, mereceu que se licitasse até à obscenidade dos 6,5 milhões de dólares. E, no entanto, houve alguém que, no remanso da sua sala, onde quer que seja, achou que aquele relógio valia 120 vezes mais o preço de catálogo. Não havendo valor objectivo que o justifique, só podemos falar de fetiche - o fetiche das primeiras coisas, ou das primeiras utilizações, ou dos primeiros lugares.

Há fetiches mais baratos, confesso.

JdB          

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