O MELHOR PRESENTE DO VATICANO
Num gesto profundamente ecuménico – conforme reconhecido pela generalidade dos comentadores – o Papa Francisco decidiu agraciar o novo soberano do Reino Unido com um presente especialíssimo, que terá lugar de honra na cerimónia da coroação, a 6 de Maio, na Abadia de Westminster: dois fragmentos da cruz de Jesus, extraídos da relíquia mais preciosa do património sagrado dos Museus do Vaticano.
O Embaixador britânico acreditado junto da Santa Sé twitou na sua conta a gratidão do povo britânico ao Papa e manifestou a sua comoção face à generosidade da partilha daquele símbolo maior da Cristandade com o líder da Igreja Anglicana. Carlos III também se apressou a agradecer a Francisco, tocado por tamanho gesto, simultaneamente bênção e bússola para a dinastia Windsor e todo o país.
Os dois fragmentos da célebre relíquia vão ser incorporados no crucifixo processional do País de Gales, que irá abrir caminho ao cortejo que conduzirá Carlos III pela nave central na Abadia anglicana de Westminster. É inspirador e ilustrativo do espírito britânico o conselho gravado numa das faces daquele crucifixo antigo, extraído do último sermão do santo patrono do País de Gales – S.David (séc.VI): «Be joyful. Keep the faith. Do the little things.»
Um vento tão favorável de Roma contrabalança um pouco com o desgosto do sucessor de Isabel II, humilhado pelo resultado de uma sondagem recente, onde a maioria se opõe a custear a cerimónia da coroação com o erário público. Percebe-se que nem Carlos, nem Camila conseguiram ainda conquistar a simpatia do país, que continua órfão de uma rainha aclamada de Norte a Sul, mas que não conseguiu a proeza de transferir para o herdeiro o prestígio acumulado nos 70 anos à frente da coroa britânica (conheceu 5 Papas).
Quem ousará fazer previsões sobre o reinado de Carlos III, que ascende ao trono já sénior, aos 74 anos? Será que tudo lhe acontece com demasiada idade? À falta de jeito para socializar, padece ainda de alguma má fama pela relação clandestina com Camila traindo, quase desde a primeira hora, a Princesa que teve as maiores (e mais eficazes) demonstrações de afeição para com o seu povo e os párias do planeta. As missões e escapadelas de Di pelo mundo fora, das generosas às aventurosas, fizeram as delícias de multidões, globalmente. A sua aura de simpatia internacional ficou patente nas suas exéquias fúnebres, visionada por telespectadores de todo o lado, dias a fio. A morte trágica, aos 36 anos, comoveu o mundo e nem Isabel II escapou a remoques críticos pela (alegada) frieza dos Windsor a lidar com a afectuosa “princesa do povo”.
Alguns, em minoria, valorizam a longevidade do affair de Carlos com a loira audaciosa, que partilha com a família real britânica a paixão pelos cavalos… um hobby estranho a Lady Di e também à generalidade das pessoas.
De Carlos conhece-se pouco, à parte da sensibilidade ecológica, do gosto pelo mundo da cultura, em especial das artes, sendo assinaláveis os seus esforços diplomáticos a tentar levar para as Ilhas britânicas as melhores colecções de arte disponíveis. Porém, o que salta à vista é a falta de empatia e alguma aselhice a lidar com o próximo, não ajudando o ar duro e distante da mulher da sua vida. Em ambos, sente-se um esforço hercúleo nos banhos de multidão e nos eventos públicos. Mas o que poderá não passar de um fraco QE do casal continua a contrastar perigosamente com o perfil de monarquia de proximidade encarnada por Diana, ainda a ensombrar Buckingham como um fantasma. Nela tudo ficava eclipsado pela sua atitude amistosa e comunicativa, capaz de partilhar urbi et orbi um gosto de viver onde parecia também haver lugar para os outros. Assim foi interpretada em vida, pelo que a violência extrema da morte prematura insuflou mais ainda a aura mítica que a acompanhou desde as primeiras notícias do noivado com o príncipe tão mais velho e de olhar triste.
Na actual encruzilhada difícil da História ganha especial força esta oferta da Santa Sé a Carlos III, presenteando-o com a maior insígnia do Rei dos reis. Era difícil haver uma dádiva mais auspiciosa para um reinado envolto em circunstâncias pouco favoráveis, quiçá hostis. Hoje, um reinado, um continente e todo um planeta clamam por uma paz duradoira, fundada na Justiça e na Verdade que os minúsculos fragmentos evocam. Certeiro e pascal.
Maria Zarco
(a preparar o próximo gin tónico, para daqui a 2 semanas)
1 comentário:
Em resumo, uma história feita de historietas de adultérios.
Claro que a este Papa nada importa senão o seu parecer jesuítico.
Santo Inácio de Loyola bem o sabia quando submeteu os seus religiosos a um quarto voto: a obediência ao Papa. Isto foi só para limitar os problemas que estes génios poderiam causar (a Companhia tem muitos génios).
Um Papa jesuíta, e portanto sem superior, é um génio louco obedecendo a uma miragem ou de uma rajada.
cumps
ao
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