Das mãos e do sentido do tacto
Há quem diga que somos auditivos ou visuais ou cinestésicos, conforme damos mais importância às cores e formas, às palavras e sons, aos gestos e toque. Embora pareça ser claro que o sentido da audição é o primeiro a manifestar-se e o último a desaparecer, talvez sejamos essencialmente cinestésicos em momentos determinantes da vida: enquanto bebés, através do contacto físico com a mãe; enquanto velhos, através de uma mão que se aperta ou um rosto que se afaga.
Talvez por isso, num texto intitulado Carta sobre os cegos para uso daqueles que veem, Diderot tenha dito pela boca de um cego que responde à pergunta sobre se ficaria contente se tivesse olhos:
Se a curiosidade não me dominasse, disse, até gostaria mais de ter braços compridos: parece-me que as mãos me informariam melhor sobre o que se passa na lua do que os vossos olhos ou os vossos telescópios; além disso, os olhos deixam de ver mais cedo do que as mãos de tocar. Valeria mais por isso aperfeiçoar o órgão que possuo do que me conceder aquele que me falta.
Hanna Arendt, em A Condição Humana, diz:
Significativamente, todas as teorias que negam aos sentidos a capacidade de perceber o mundo contestam que a visão seja o mais alto e mais nobre dos sentidos, e substituem-no pelo tacto ou paladar que, na verdade, são os sentidos mais privados, ou seja, aqueles nos quais o corpo, ao perceber um objecto, se sente basicamente a si mesmo. Todos os pensadores que negam a realidade do mundo exterior teriam concordado com Lucrécio, que disse: ‘o tacto e nada mais que o tacto é a essência de todas as nossas sensações corporais.”
O toque de uma mão pode ter um efeito redentor. Na verdade, a Bíblia fala mais de um Cristo que toca, que impõe as mãos, do que de um Cristo que olha ou que ouve. Mas o toque de uma mão pode nascer de um gesto egoísta – ou apenas de uma necessidade afectiva: o acto de tocar como desejo de ser tocado. Eu toco porque quero ser tocado.
Andrew Charles Carlson
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