19 agosto 2009

O Barqueiro e o Erudito

Conta-se que uma vez um homem erudito aproximou-se da margem de um rio, para que o barqueiro lhe permitisse atravessa-lo. O erudito parecia que carregava toda a sua importância junto com o seu conhecimento, como se temesse perde-lo. E assim, com soberba de letrado, disse ao humilde e serviçal barqueiro:
- Podes passar-me para a outra margem?
- Sim, claro, são duas rupias.
E o letrado temendo sujar-se ao tocar o barqueiro, entregou-lhe essas moedas.
Quando já estavam a atravessar o rio, e enquanto o barqueiro fazia o seu trabalho, o erudito perguntou:
- Barqueiro, estudaste Sânscrito? A língua em que, sabes, foram escritos os Vedas, os Upanishads, as epopeias do Mahabharata e o Ramayana, todos os Puranas e Upapuranas, a língua de Valmiki e Vyasa, a língua em que foi escrito o glorioso Bhagavad Gita, resumo de todo o conhecimento?
- Não senhor, nada sei de dita língua
- Oh, que desperdício de vida, então nada te posso dizer da beleza de suas estruturas sintácticas, dessas formas sublimes analisadas pelo ilustre Patanjali.
- E sabes, por acaso, Latim? A língua de Virgílio e de Cícero, tão belamente sonora e rítmica, como dizia em seus discursos o grande pretor romano, Quo usque abutere patientia nostra, que significa “Até quando abusarás da nossa paciência”? Oh, Oh, perdeste sem nenhuma dúvida metade da tua vida inutilmente.
- Não senhor, disso também não sei nada.
- Oh que tristeza de vida, então também não terás lido os versos amorosos de Ovídeo e Catulo, ou as tragédias de Séneca. Oh, Oh, Oh, perdeste sem duvida metade da tua vida.
E conheces os mistérios da Geometria?, que permite medir as distancias e as superfícies, classificar os ângulos, reconhecer os tipos de triângulos e fundamentar o cálculo diferencial para, claro poder estudar a Dinâmica dos Fluidos, tão necessário num trabalho como o teu?
- Oh, senhor, nada sei de Geometria
- Bem, bem, bem, oh, vida miserável e arruinada, perdeste metade da tua vida.
E Aritmética?, para distinguir os números racionais, os transcendentes, os imaginários?; sabes que Pi, o número que resulta da divisão da circunferência pelo diâmetro é um numero transcendente, tal como o número que permite calcular a forma de uma Ciclóide, que é como a forma que assume esta corda estendida na tua barca?
- Não, não, nada sei de Aritmética
Nisto as águas do rio começaram a agitar-se, movidas por uma tempestade, que de repente e com surpreendente violência começou a agitar a barca. Porem o erudito estava tão possuído de seus conhecimentos e com tanta soberba para com o humilde barqueiro que não se apercebia. Repetia, perdeste metade da tua vida inutilmente. E continuava instigando o nosso barqueiro com perguntas com as quais demonstrava orgulhosamente o seu saber.
- Ah claro, e seguramente também não sabes nada de Metafísica, dos mistérios da ontologia e as categorias do Ser….
- Ah, desculpe, desculpe, senhor, e você sabe nadar?
- Eu, Eu, e porque me pergunta isso, eu não sei.
- Pois nesse caso, vai perder a sua vida inteira, porque esta barca afunda-se, afunda-se, afunda-se.
Mais importante que acumular conhecimentos é encontrar o sentido da vida, como um fio mágico que conduz a nossa existência. O grande sábio Pitágoras dizia que melhor que um tonel de conhecimento é uma gota de verdadeira sabedoria, e a sabedoria que já é a alma da vida, é quem nos pode orientar no meio das tempestades do mundo. A nossa vida é uma barca frágil, o barqueiro é a consciência.
O que é mais importante que chegar, a tempo e bem, ao porto sonhado, e não fundir-se nas enganosas águas do que não somos, não cedendo aos cantos de sereia do mundo? O mais importante de aprender é a Arte De Viver.

2 comentários:

Ana CC disse...

Santa ignorância. Já deixei de chorar no meu canto. Sei nadar e sei levar a barcaça a bom porto. Bom dia Jdb.

Anónimo disse...

O B R I G A D A . por tudo. a.braço-o.

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