20 novembro 2009

lovely theresa

pediu desculpa ao mundo, a todos, aos que amara acima de tudo,
pelo modo deselegante que escolhera como porta de embarque,
rumo a esse imenso vazio / devir (riscar o que não interessa)
que pode ser o infinito, especialmente se projectado no tempo,
isso a que se chama também eternidade, como bem sabemos.

pediu desculpa a todos, a tudo, ao mundo, às lovely girls que amara,
pelo modo que escolhera para sair do mundo, do espaço, do tempo.
ensaiara as últimas linhas com a serenidade do artesão que sabe, e sente,
que um dia a jóia nas suas mãos será a última, a derradeira saída
dessa linha de desmontagem que foi a sua vida (qualquer uma).

i love(d) you all, lera um dia numa sofisticada revista de upper manhattan,
era a mais terna e sincera das frases de despedida. ainda hoje, anos depois,
sabia que a lovely theresa que, ainda viva, assinara o bilhetinho seria decerto
inultrapassável, nesse desesperado e radical campeonato (ou arte suprema?)
dos que, em surdina, escolheram escolher a morte, em plena vida.

porém algo nele resistia. influência de obscuros filósofos lidos na juventude,
gritando ao seu ouvido: nenhuma negação pode ser uma opção livre.
e ele queria acreditar, tal como queria acreditar que não se morre de amor,
nem por delicadeza, nem por generosidade, nem por qualquer acto de grandeza.
morre-se, tão-só, quando não se aguenta a dor, a vida tornada intolerável.

por isso mesmo, por ser uma contradição extrema, algo nele resistia
a aceitar que da livre escolha possa resultar a aniquilação auto-infligida.
mas se o que se mata, não é a vida, afinal - o que se mata é antes a dor -
demonstrado está, e adormeceu veramente contente, o axioma maior:
não se morre por somenos, morre-se para matar para sempre essa dor,

que, às vezes, é vida,
outras vezes, medo.
que, às vezes, é vertigem,
outras vezes, ferrugem.
que, às vezes, é nervo,
outras vezes, tudo o que fica

depois de esgotada e finda a derradeira possibilidade do amor.


gi

7 comentários:

Anónimo disse...

já ouviu falar em esperança, gi? independentemente da carga deste poema, lê-lo é, de facto, something ... pcp

Anónimo disse...

olá, pcp.
já ouvi falar de quase tudo. 'disso' também..
o meu mandamento é 'quanto mais poético, mais real'. às vezes, o real é que deixa muito a desejar. por isso, mergulhar na poesia pode ser uma forma de transformar o real. em múltiplos sentidos. olhar para as cinzas, com lucidez, para melhor renascer, com ousadia e esperança.
mas quem sou eu..
obrigado.
flores,

gi.

Anónimo disse...

Sem dúvida. Como o percebo. Não pense que não percebo, que aquilo que escreve me é desconhecido. Simplesmente apelo, se é que disso se trata, a olhar para a poesia NA Vida. Que também a há. Mas lá está, quem sou eu ... obrigada pela(s) sua(s) resposta(s). em última análise, como já lhe disse várias vezes, você pode escrever sobre o que quiser, no tom que quiser. escreve tão bem! pcp

Anónimo disse...

quanta gentileza, minha senhora.
escrevo para poder viver, de certa maneira. uma estranha forma de vida? talvez sim..
muito obrigado.
votos de um fim-de-semana bonito,
e flores,

gi.

DaLheGas disse...

querido gi, para já venho só agradecer o idioma :)

Anónimo disse...

(é quando te vestes de arrastada melancolia
e me estremeces o (des)acertado passo
numa pueril, ousada e doce fantasia
de te mimar no colo c'o meu abraço)
...

em surdina,
numa nuvem de castanhos laços
e de castanhas partidas em pedaços

Anónimo disse...

(que) coisa bonita..
o outono tem coisas assim, de um azul dourado.

flores gratas,

gi.

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