19 janeiro 2017

Eventos dos dias que correm


Foi ontem. Perante uma plateia bem composta de colegas de faculdade e outras pessoas que não conhecia, declamei, a meias com um rapaz actor de teatro e com quem também me cruzei nas aulas, quatro poemas de João de Deus, um dos quais reproduzido abaixo juntamente com uma versão declamada que encontrei na net. Foi uma experiência interessante, ainda que com alguns nervos à mistura. E lembro-me de um post que escrevi há algumas semanas sobre o que nos tinha dado a idade. A mim deu-me, entre outras, esta capacidade de vencer uma vergonha e uma dificuldade de exposição.

Agradeço à Helena Miranda e ao Tomás Castro o desafio. Que tenham gostado, é o que me interessa mais.

JdB

***

O DINHEIRO

O dinheiro é tão bonito, 
Tão bonito, o maganão! 
Tem tanta graça, o maldito, 
Tem tanto chiste, o ladrão! 
O falar, fala de um modo... 
Todo ele, aquele todo... 
E elas acham-no tão guapo! 
Velhinha ou moça que veja, 
Por mais esquiva que seja, 
                            Tlim! 
                            Papo. 

E a cegueira da justiça 
Como ele a tira num ai! 
Sem lhe tocar com a pinça; 
E só dizer-lhe: «Aí vai...» 
Operação melindrosa, 
Que não é lá qualquer coisa; 
Catarata, tome conta! 
Pois não faz mais do que isto, 
Diz-me um juiz que o tem visto: 
                            Tlim! 
                            Pronta. 

Nessas espécies de exames 
Que a gente faz em rapaz, 
São milagres aos enxames 
O que aquele demo faz! 
Sem saber nem patavina 
De gramática latina, 
Quer-se um rapaz dali fora? 
Vai ele com tais falinhas, 
Tais gaifonas, tais coisinhas... 
                            Tlim! 
                            Ora... 

Aquela fisionomia 
É lábia que o demo tem! 
Mas numa secretaria 
Aí é que é vê-lo bem! 
Quando ele de grande gala, 
Entra o ministro na sala, 
Aproveita a ocasião: 
«Conhece este amigo antigo?» 
— Oh, meu tão antigo amigo! 
                            (Tlim!) 
                            Pois não! 

João de Deus


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