Já aqui escrevi, breve e desinteressadamente, sobre os provérbios portugueses, tão cheios de contradições. Ontem, na ressaca de um almoço com um amigo recente mas com quem partilho conversas várias, ocorreu-me uma frase que papagueei tantas vezes, cheio de um engano todo feito de ilusão adulta. A frase é: quem me dera ter 18 anos e saber o que sei hoje. Por trás deste pensamento está a ideia de que viveríamos melhores se fossemos jovens cheios de uma sabedoria de anciãos. Parece-me que o conceito está todo errado, uma vez que me apetece dizer: quem me dera ter a idade que tenho e saber o que sabia aos 18 anos.
Quando me formei estagiei breves meses na TAP, onde aprendi, sobretudo, o que era uma boa cantina. O resto era vagamente para mim, porque apesar de um curso de engenharia, nunca fiz um curso de engenharia. Mas cruzei-me com um colega do meu Pai que proferira uma frase luminosa, que ainda repetimos amiúde, mesmo que pelos motivos nem sempre certos (até porque não sabemos o que pensava o Dr. Pedro, autor da frase): quem me dera não saber ler.
Estou certo de que o Dr. Pedro não defendia para si próprio a ignorância ou o desconhecimento das coisas. Estou certo, presumidamente, que defenderia a candura do espírito, o enchimento da mente com a sabedoria dos simples, a desintoxicação das informações excedentárias ou obsoletas ou redundantes. No fundo, que soubéssemos o que acrescenta valor à vida, não o que é supérfluo. Que fossemos crianças espantadas com a vida, maravilhadas com a diversidade, não vítimas das rotinas que tudo matam, das frases mal interpretadas ou mal ditas, dos discernimentos adultos que malbaratam muito e aproveitam pouco.
A vida é globalmente difícil, com inúmeras frentes por onde atacar - carreiras, finanças, perdas de estatuto, lutas de poder, preocupações com filhos ou com pais ou consigo próprios. Mas há uma franja da nossa vida que não está sujeita a estas preocupações, que pode ser sempre uma receita simples e eficaz, que nos mostra o sol em dias sombrios. É essa parte da nossa vida relativamente à qual temos de dizer que não queremos saber ler, ou que queremos ter a idade que temos e saber o que sabíamos aos 18 anos, que era pouco e esse pouco cheio de esperança.
JdB
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